Os protestos pós-eleitorais em Moçambique têm causado danos devastadores ao sector da saúde, comprometendo severamente a prestação de serviços essenciais à população. Na província de Nampula, pelo menos 16 centros de saúde foram destruídos durante as manifestações, que marcaram as últimas semanas. O Governador de Nampula, Manuel Rodrigues, condenou os actos de vandalismo, sublinhando a gravidade da situação. “Destruir centros de saúde é manifestação? O que um centro de saúde tem a ver com reclamações eleitorais?”, questionou o governador.
A destruição não se limitou às infraestruturas. Materiais médicos essenciais, como camas, equipamentos hospitalares e medicamentos, foram saqueados, agravando ainda mais a já frágil capacidade de resposta do sistema de saúde em regiões vulneráveis. O governador apelou à população para preservar as infraestruturas de saúde, reforçando que “não vandalizemos os hospitais.”
Impacto Nacional: Um sector em risco
Os danos não se restringem ao norte do País. Em todo o território moçambicano, os protestos resultaram em perdas significativas para o sector da saúde. Segundo o Ministro da Saúde, Armindo Tiago, o armazém central da Central de Medicamentos e Artigos Médicos, em Maputo, foi incendiado e saqueado, causando prejuízos superiores a 15,2 milhões de dólares. Este valor inclui a destruição de medicamentos avaliados em 5 milhões de dólares e a perda de materiais hospitalares destinados a cerca de 70 mil profissionais de saúde, estimados em 10 milhões de dólares.
Além disso, 77 viaturas do sistema de saúde foram vandalizadas ou destruídas durante as manifestações. “Precisaremos de pelo menos dois anos para recuperar os impactos desta destruição no sector da saúde,” afirmou o ministro, que alertou para a impossibilidade de armazenamento de novos insumos médicos devido à destruição do armazém central.
A nível nacional, cerca de 1.800 unidades sanitárias foram directa ou indirectamente afectadas pelas manifestações, segundo a Plataforma da Sociedade Civil para Saúde (Plasoc-M). Em algumas regiões, unidades foram forçadas a encerrar devido à falta de pessoal médico, enquanto outras operaram sob intensa pressão para atender vítimas dos conflitos. Gilda Jossias, presidente da Plasoc-M, destacou que “estes actos não só afectam o governo, mas também prejudicam as comunidades, que ficam desprovidas de assistência médica essencial.”
Confrontos e restrições no acesso à saúde
Os protestos têm dificultado o acesso aos serviços de saúde, com bloqueios de estradas e insegurança generalizada. No Hospital Central de Nampula, o maior do norte do país, 21 pessoas morreram e 116 ficaram feridas em incidentes relacionados com as manifestações, apenas entre 23 e 25 de Dezembro. Além disso, o lançamento de gás lacrimogéneo em recintos hospitalares e o bloqueio de vias têm impedido pacientes de receber atendimento ou de regressar às suas casas após alta hospitalar.
A Plasoc-M relatou que 21.494 pessoas, incluindo doentes crónicos e pacientes em tratamento antirretroviral, foram directamente afectadas pela crise no sector da saúde. “É urgente que o Governo adopte medidas alternativas para assegurar a provisão de serviços, particularmente aos mais vulneráveis,” reiterou Gilda Jossias.
Campanhas de emergência e esforços de recuperação
Para enfrentar os impactos imediatos, o Ministério da Saúde lançou uma campanha nacional de doação de sangue, com o objectivo de arrecadar pelo menos 3.000 unidades para atender a crescente demanda por transfusões, especialmente para vítimas de traumas e outras emergências. Esta campanha surge como uma medida paliativa num contexto de recursos severamente limitados.
Apesar destes esforços, as consequências a médio e longo prazo são alarmantes. A destruição das infraestruturas de saúde e a perda de insumos médicos ameaçam comprometer a qualidade e a acessibilidade dos serviços básicos em todo o país. “As mulheres e crianças são as mais afectadas, e o impacto será agravado com a proximidade do ciclone Chido,” alertou Gilda Jossias.
A urgência de uma resposta coordenada
A destruição dos centros de saúde e o impacto generalizado nos serviços médicos reflectem os efeitos devastadores dos protestos pós-eleitorais em Moçambique. A necessidade de reconstrução vai além da reposição física das infraestruturas: é essencial implementar políticas que assegurem a continuidade dos serviços e que protejam os direitos básicos das populações mais vulneráveis.
À medida que o país se prepara para enfrentar os desafios da recuperação, será indispensável uma coordenação eficaz entre o governo, a sociedade civil e os parceiros internacionais para restaurar a funcionalidade do sistema de saúde e evitar novas crises. Como sublinhou o Governador Manuel Rodrigues, “não podemos permitir que o sector da saúde, vital para o bem-estar da população, seja um dos maiores alvos de destruição.”
Fonte: O Económico