Questões-Chave
A crise cambial que afecta Moçambique está longe de ser apenas uma questão local. Para o economista Mussagi Cassamo, trata-se de um sintoma de uma transformação estrutural da arquitectura monetária global, marcada pelo colapso do mercado obrigacionista norte-americano e pela retração do dólar como moeda de referência internacional. O modelo tradicional de acesso a divisas está esgotado, e Moçambique precisa adaptar-se rapidamente.
No centro da análise de Cassamo está a ideia de que Moçambique já não pode depender de um modelo cambial assente na acessibilidade passiva ao dólar. A quebra do mercado de obrigações dos EUA, acelerada pela guerra comercial com a China e pela redução da procura chinesa por dólares, criou um bloqueio sistémico à liquidez global. Este colapso não é apenas financeiro — é estrutural e paradigmático.
Cassamo argumenta que o mundo assiste à reconfiguração da confiança no dólar como “porto seguro”. Desta vez, os investidores fugiram para metais preciosos, e não para o dólar — um indicador claro da erosão da hegemonia da moeda norte-americana. Os efeitos estão à vista: escassez de moeda externa, fragilidade cambial e pressão sobre o sector privado moçambicano.
A tese central de Cassamo é clara: Moçambique está a pagar o preço por ter ficado para trás na transformação digital do sistema financeiro global. A ausência de mecanismos próprios de compensação digital ou moedas estáveis internas expõe o país a uma dinâmica cambial exógena e imprevisível.
A resposta à crise cambial passa, antes de tudo, por reconhecer que o velho modelo não é recuperável. É necessário repensar os fundamentos da integração financeira internacional de Moçambique, com base em infra-estrutura digital financeira, mecanismos de compensação modernos e soluções soberanas para circulação de liquidez interna. O tempo para agir é agora.
Fonte: O Económico