O homem que escolheu a liberdade colectiva, mesmo estando preso

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Por: Alfredo Júnior

 

Há figuras que pertencem ao mundo, mas que nascem da dor concreta de um povo. Nelson Mandela é uma dessas figuras. Nasceu no dia 18 de Julho de 1918, numa África do Sul profundamente dividida, onde a cor da pele definia o valor da vida. Cresceu num tempo em que a liberdade era um privilégio dos brancos e a dignidade dos negros era sistematicamente negada por um regime legalizado de opressão, o apartheid.

Ao longo de décadas, a sua luta foi contra o conformismo, contra o silêncio cúmplice e contra a ideia de que alguns nasceram para mandar e outros para obedecer.

Mandela foi preso porque fez política e, libertou o seu povo porque soube fazer ainda melhor política depois da prisão. A sua luta contra o apartheid começou com discursos, mas rapidamente evoluiu para acções concretas organização de massas, mobilização internacional, articulação com outros movimentos africanos e até recurso à luta armada, quando a violência do Estado já não deixava espaço para negociações.

O que marca a diferença é que Mandela nunca foi apenas reactivo, ele pensava à frente. Sabia que o fim do apartheid era inevitável, mas entendia que o seu desfecho poderia arrastar o país para a guerra civil ou levá-lo à democracia e preparou-se para garantir a segunda opção.

Enquanto muitos o viam como um simples preso político, Mandela estudava, organizava ideias, estabelecia canais de comunicação com os inimigos, sem nunca trair os seus, quando saiu da prisão, saiu com um plano, não apenas libertar os oprimidos, mas também salvar os opressores da ruína de uma transição violenta. E foi assim que entrou para a história não só como libertador, mas como fundador da democracia sul-africana.

Negociou com o regime do apartheid sem se ajoelhar, manteve os princípios da luta armada enquanto abria portas ao diálogo. Formou um governo de unidade nacional que incluía antigos adversários, não porque confiava neles, mas porque sabia que a estabilidade precisava de inclusão, mesmo que desconfortável

Ao assumir a presidência em 1994, Mandela tinha o país nas mãos, mas não agiu com sede de revanche, ao contrário de muitos líderes africanos que ascenderam ao poder com legitimidade e depois se perderam no autoritarismo, ele soube a hora de sair, governou por apenas cinco anos, não porque lhe faltasse apoio, mas porque lhe sobrava visão

Na prática, os seus anos no poder foram marcados por reformas institucionais, fortalecimento das liberdades civis, início de políticas de acção afirmativa e, acima de tudo, pela criação da Comissão da Verdade e Reconciliação. Um gesto de coragem política. Um país que tenta enfrentar o seu passado sem fingir que ele não existiu.

É verdade que a África do Sul, hoje, vive desafios sérios de corrupção, violência, desigualdade, mas imaginar o que teria sido esse país sem Mandela ao centro da transição política é um exercício de realismo duro. Poucos líderes no mundo moderno conseguiram transformar a dor colectiva num projecto político pacífico e funcional, mas Mandela conseguiu, e pagou um preço alto por isso, cedeu, esperou, negociou, perdoou.

Lembrar Mandela é lembrar que a política, em sua melhor forma, é arte de criar caminhos onde parece haver apenas confrontos. Ele não foi perfeito, nem tentou ser, mas mostrou que é possível ser radical na dignidade e sensato na condução.

Num tempo em que muitos usam a política para dividir, Mandela usou-a para reconstruir e ao contrário de tantos, quando teve poder total, não o usou para se vingar  usou-o para servir, isso é mais do que história, é lição, e das mais importantes.

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