Por: Sara Seda
As estradas da cidade parecem viver permanentemente em cuidados intensivos, se fossem gente, já tinham cartão de saúde no hospital. Todos os dias há uma “cirurgia” em alguma avenida, pás e escavadoras multiplicam-se como máquina de hemodiálise das obras públicas, de preferência na hora de maior trânsito, como se o caos fosse parte do projeto.
Há ruas que parecem pele com sarna. Buracos por todo o lado, máquinas a abrir crateras na hora de ponta, porque o planeamento, claro, é inimigo da diversão. E quando não é chuva, é um tubo de água rebentado durante uma manutenção apressada e mal calculada. O que devia ser manutenção transforma-se em hemorragia: litros e litros a correr rua abaixo, como se a cidade tivesse bebido demais e não aguentasse a bexiga.
As valetas parecem mais artérias entupidas, comem lixo sem parar, acumulam gordura dos take aways e deixam o “colesterol” urbano em níveis perigosos, e quando chega a chuva, a circulação falha e o resultado é previsível: a cidade sofre um AVC, traduzido em inundações que paralisam tudo. O cidadão com água até aos joelhos, a tentar perceber se aquilo é realmente inundação ou hidroginástica grátis.
O coração da urbe coitado, anda sobrecarregado e ameaça um ataque cardíaco. O ‘cardiologista’ engenheiro civil, apenas limita-se a remendar feridas, pensos rápidos em hemorragias profundas. Entre buracos, águas de esgoto e lombas improvisadas, até os carros mais resistentes parecem sucumbir.
As obras públicas transformaram-se em teatro de cirurgias repetidas. Estradas abertas e reabertas, como se o “doutor” não soubesse bem onde está a dor. Depois há aquela cirurgia estética chamada “obras em tempo de eleições”. É um clássico. O alcatrão brilha, o político sorri, e a população até acredita que, finalmente, a estrada vai durar, mas vem a primeira chuva e o asfalto desfaz-se como aspirina em copo de água, fica um buraco em forma de coração. Uma espécie de cirurgia mal planeada, como abrir uma barriga numa cesariana e só depois lembrar-se: “Espera, faltou o útero!”. Romântico, se não fosse mortal.
Se as estradas falassem, gritariam por socorro e pediam eutanásia. Cada buraco é uma paragem cardíaca.





