Resumo
O novo relatório da UNCTAD destaca a importância do comércio internacional na aceleração da transição climática, sendo agora um pilar central da ação climática, influenciando investimentos, padrões de consumo e políticas industriais. No entanto, para os países em desenvolvimento, é crucial garantir que a integração verde nas cadeias globais não aumente as desigualdades, mas sim amplie as oportunidades. A COP30 em Belém do Pará confirma que o comércio tornou-se parte integrante das estratégias climáticas nacionais e multilaterais, com mais de 70% das contribuições nacionais incluindo medidas relacionadas com o comércio. A UNCTAD alerta para a assimetria entre países industrializados e em desenvolvimento, destacando a necessidade de políticas que evitem a exclusão destes últimos na economia verde.
A relação entre comércio e clima deixou de ser marginal para se tornar estrutural. Segundo a UNCTAD, o comércio internacional é agora um dos pilares centrais da acção climática, influenciando investimentos, padrões de consumo, cadeias de valor e políticas industriais. No entanto, a transição verde global coloca dilemas complexos para as economias em desenvolvimento, que enfrentam simultaneamente a necessidade de reduzir emissões e de crescer.
O Comércio Como Novo Vector da Diplomacia Climática
A COP30, a decorrer em Belém do Pará, confirma uma tendência já visível desde o Acordo de Paris: o comércio tornou-se parte integrante das estratégias climáticas nacionais e multilaterais. O relatório Trade Powers Climate Ambition sublinha que mais de 70% das contribuições nacionais determinadas (NDCs) dos países incluem hoje medidas directamente ligadas ao comércio — desde incentivos fiscais a exportações verdes até regimes tarifários preferenciais para tecnologias limpas.
A UNCTAD defende que o comércio pode funcionar como um canal de difusão tecnológica e de financiamento verde, mas alerta para a assimetria entre países industrializados e países em desenvolvimento. Enquanto as economias avançadas beneficiam de cadeias logísticas e inovação consolidadas, muitas economias africanas e latino-americanas enfrentam barreiras não tarifárias, fraca diversificação e défice de financiamento climático.
No actual contexto, as regras comerciais globais estão a ser reconfiguradas por políticas como o Mecanismo de Ajuste de Carbono da União Europeia (CBAM) e por novas alianças verdes. Estas iniciativas, embora destinadas a promover a descarbonização, levantam questões sobre equidade, competitividade e justiça climática.
A Economia Verde e o Risco de Novas Fronteiras de Exclusão
A expansão do comércio verde — que hoje ultrapassa os 2,5 biliões de dólares anuais em mercadorias e serviços sustentáveis — traz consigo um paradoxo. Se, por um lado, representa uma oportunidade sem precedentes para diversificar exportações, por outro, tende a consolidar novas fronteiras tecnológicas e normativas que podem marginalizar países com baixa capacidade produtiva.
A UNCTAD adverte que a economia verde corre o risco de reproduzir o padrão de dependência histórica, se as nações em desenvolvimento se limitarem a exportar matérias-primas “verdes”, como lítio, grafite ou energia renovável não transformada. Sem políticas industriais activas e sem investimento em tecnologia, a transição verde poderá traduzir-se num “novo extrativismo verde”, pouco inclusivo e de reduzido valor agregado.
Neste sentido, a integração das políticas comerciais e climáticas é vista como essencial para evitar que as novas cadeias de valor — centradas em baterias, hidrogénio, veículos eléctricos e energias limpas — reforcem o fosso entre Norte e Sul.
Oportunidades e Desafios para África e Moçambique
Para África, e particularmente para Moçambique, o comércio sustentável oferece uma dupla oportunidade: atrair investimento verde e diversificar a base exportadora. A aposta nas energias renováveis, na produção agrícola sustentável e na exportação de minerais críticos (como grafite e lítio) coloca o país num eixo de importância crescente no contexto da transição energética global.
Contudo, os ganhos potenciais só se concretizarão se forem acompanhados de políticas de conteúdo local, inovação tecnológica e capacitação industrial. O relatório da UNCTAD destaca que o financiamento verde destinado a África representa menos de 4% do total global, o que limita a capacidade de adaptação das economias mais vulneráveis.
Moçambique, ao apresentar na COP30 a sua Agenda de Resiliência Climática, estimada em 37,2 mil milhões de dólares até 2030, reforça o argumento de que sem financiamento climático acessível e previsível, não há comércio verde inclusivo.
Além disso, a diversificação exportadora exige infra-estruturas logísticas resilientes e políticas fiscais que estimulem o investimento privado em cadeias de valor sustentáveis. A ligação entre o Programa Nacional de Industrialização, o Fundo de Desenvolvimento Económico Local (FDEL) e as metas de descarbonização pode ser decisiva para alavancar a competitividade moçambicana.
Entre Ambição e Realidade: O Desafio da Implementação
O comércio, como motor da ambição climática, exige coerência entre discurso e prática. A UNCTAD identifica três áreas críticas:
Sem estas condições, a promessa de uma globalização verde pode tornar-se um novo ciclo de dependência e exclusão.
“O comércio deve ser um aliado da ambição climática, não um instrumento de desigualdade”, sublinha a UNCTAD, acrescentando que a cooperação internacional será o verdadeiro teste da coerência da transição verde.
Uma Nova Agenda para Moçambique e o Sul Global
A leitura estratégica é clara: a integração do comércio e do clima redefine o conceito de desenvolvimento. Para países como Moçambique, o futuro dependerá da capacidade de transformar a vulnerabilidade climática em vantagem comparativa, posicionando-se como exportador de soluções sustentáveis e não apenas de recursos naturais.
Ao mesmo tempo, a agenda nacional deve incorporar parcerias público-privadas verdes, inovação tecnológica e diplomacia económica activa para captar investimento e acesso a mercados verdes.
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p style=”margin-top: 0in;text-align: justify;background-image: initial;background-position: initial;background-size: initial;background-repeat: initial;background-attachment: initial”>Em suma, o comércio tornou-se um instrumento central da política climática global. O desafio para Moçambique — e para o continente africano — é garantir que este novo paradigma seja também um instrumento de desenvolvimento equitativo e soberano.
Fonte: O Económico






