Resumo
A COP30 em Belém do Pará foca-se no financiamento climático, com países vulneráveis a exigir compromissos reais e transformadores. O ambiente tenso da cimeira é marcado por discursos fortes e negociações intensas. O secretário-geral da ONU, António Guterres, destacou a urgência de cumprir a meta dos 1,5°C, considerando-a uma questão moral. O novo objetivo global de financiamento climático, o New Collective Quantified Goal (NCQG), propõe mobilizar 1,3 biliões de dólares anuais até 2035. Delegações asiáticas e africanas defendem que o financiamento não deve aumentar a dívida dos países já sobrecarregados, exigindo recursos equilibrados e previsíveis. A Índia destaca a necessidade de financiamento concessional para garantir a eficácia das medidas climáticas.
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p style=”margin-top: 0in;text-align: justify;background-image: initial;background-position: initial;background-size: initial;background-repeat: initial;background-attachment: initial”>A COP30 avança em Belém do Pará sob forte tensão política e elevada expectativa internacional. O financiamento climático tornou-se o eixo central das negociações, num momento em que os impactos climáticos se intensificam e os países vulneráveis exigem compromissos reais, previsíveis e transformadores.
A COP30 está a decorrer sob um ambiente carregado, marcado por discursos contundentes, negociações intensas e um sentimento generalizado de urgência. Realizada no coração da Amazónia, a cimeira é dominada pelo tema que países vulneráveis vêm exigindo há mais de uma década: financiamento climático real, previsível e adequado à escala da crise. Na abertura, António Guterres deixou a fasquia política elevada ao afirmar que “falhar na defesa da meta dos 1,5°C é uma falha moral e uma negligência mortal”, sintetizando o espírito desta COP: o mundo está fora do caminho — e a janela para agir está a fechar-se.
O financiamento climático como o eixo que define a credibilidade da COP30
No centro das discussões está a definição do New Collective Quantified Goal (NCQG), o novo objectivo global de financiamento climático que substituirá a meta — nunca cumprida — dos 100 mil milhões anuais estabelecidos em Copenhaga. A proposta actualmente em debate aponta para a mobilização de 1,3 biliões de dólares anuais até 2035, uma escala financeira sem precedentes.
A questão não é apenas o valor, mas como e em que condições esse montante será disponibilizado. Delegações asiáticas e africanas insistem que “financiamento climático não pode significar mais dívida para países já sobrecarregados”, sublinhando que a maior parte dos recursos tem sido oferecida sob a forma de empréstimos. A Índia foi directa ao afirmar que o financiamento tem de ser “equilibrado, concessional e previsível”, caso contrário a arquitectura climática continuará a falhar os países de baixo rendimento.
Tratam-se de declarações que reflectem a frustração acumulada. Como afirmou um negociador africano, “não podemos reconstruir eternamente depois de cada ciclone sem meios para prevenir a próxima tragédia”.
Adaptação ganha protagonismo e transforma a dinâmica das negociações
Ao contrário de cimeiras anteriores, onde a mitigação ocupava o centro do debate, a COP30 dá uma visibilidade inédita à adaptação climática. As delegações vulneráveis destacam que os impactos já não são riscos futuros, mas realidades económicas e humanitárias que se intensificam.
Entre os temas mais marcantes estão a definição de indicadores para operacionalizar o Global Goal on Adaptation, o reforço de sistemas universais de alerta precoce, a necessidade de infra-estruturas resilientes e a adaptação agrícola. Delegados africanos sublinharam que “mitigar sem adaptar é destruir hoje para salvar amanhã”, uma síntese clara da urgência que enfrentam.
A adaptação, frequentemente negligenciada em orçamentos e compromissos políticos, tornou-se um dos pilares desta COP porque as perdas e danos já são demasiado grandes para serem ignorados.
Fractura Norte–Sul aprofunda-se com o debate sobre combustíveis fósseis
O anúncio de um roteiro global para a redução progressiva de petróleo e gás, apresentado por um grupo de países liderados por Alemanha, Reino Unido e Dinamarca, reacendeu tensões com países produtores. O Quénia, que integra este bloco, defende que é necessário “assumir um compromisso inequívoco com o abandono dos fósseis”.
Mas várias nações produtoras, incluindo Angola, Nigéria e Moçambique, responderam que esta abordagem ignora realidades económicas e desigualdades históricas. Um delegado africano afirmou: “não se pode pedir que países que ainda não industrializaram abdiquem das suas únicas fontes de receita sem alternativas reais e financiadas”.
Para Moçambique, onde o gás natural é pilar do desenvolvimento industrial e fiscal, o debate é particularmente sensível. A definição de um roteiro global sem financiamento adequado pode limitar o espaço económico do país e comprometer estratégias nacionais.
A Amazónia como palco político e emocional da COP30
A escolha de Belém do Pará para sediar a cimeira amplificou debates ligados à protecção florestal, direitos indígenas, mercados de carbono e justiça ambiental. A Amazónia tornou-se não apenas cenário, mas protagonista.
Protestos de grupos indígenas invadiram o recinto, numa das imagens mais marcantes dos primeiros dias. Uma das líderes afirmou: “a floresta não é negociável; ela é a nossa casa e a casa do clima global”. A presença de manifestações dentro do centro da conferência colocou pressão adicional sobre governos para acelerar compromissos concretos e evitar abordagens meramente declarativas.
A questão essencial: quem paga a transição climática — e em que termos?
O pano de fundo de todas as negociações é uma pergunta simples, mas politicamente explosiva: quem financia a transição climática global?
A resposta permanece indefinida. Os países desenvolvidos resistem a compromissos vinculativos de longo prazo. Os países vulneráveis insistem que sem apoio financeiro significativo não podem reduzir emissões, adaptar infra-estruturas nem proteger populações. Como sintetizou um negociador dos PMA’s: “promessas não constroem diques, não restauram colheitas perdidas e não reconstróem casas destruídas pela água”.
É neste contexto que a COP30 se torna um teste à credibilidade do sistema multilateral: ou o financiamento emerge como compromisso concreto, ou a confiança no processo climático pode sofrer danos profundos.
A COP30 aproxima-se de uma fase decisiva com uma constatação clara: não haverá transição climática global sem financiamento climático justo, previsível e acessível. As decisões das próximas horas dirão se esta será a conferência em que o mundo finalmente transformou ambição em compromisso — ou apenas mais um capítulo de hesitação. Para países vulneráveis, como Moçambique, a diferença entre uma coisa e outra pode significar décadas de avanço ou de perda.
Fonte: O Económico






