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Monday, October 27, 2025
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A morte lenta da Cultura Geral em Moçambique

Por: Gelva Aníbal

O sistema educativo moçambicano tem vindo a cumprir uma função essencial: formar profissionais capazes de integrar no mercado de trabalho. Porém, uma dimensão fundamental da educação tem sido deixada de lado. A cultura geral, entendida como o conjunto de conhecimentos sobre história, artes, literatura, música e ciência que molda o pensamento crítico e a identidade de uma sociedade, está cada vez mais ausente das escolas. Este vazio curricular não é apenas uma lacuna académica, é uma ameaça silenciosa ao futuro da juventude moçambicana.

A realidade nas escolas do país revela um ensino focado na memorização e na preparação para exames, com pouco espaço para a reflexão crítica ou para a exploração de temas culturais. A história é ensinada de forma fragmentada, a literatura é muitas vezes reduzida a autores estrangeiros e a música e as artes visuais recebem atenção mínima. Enquanto a sociedade evolui, os alunos saem das salas de aula com competências técnicas, mas sem referências culturais que lhes permitam compreender o mundo que os rodeia e construir opiniões próprias.

A ausência de cultura geral não se limita à escola, é um fenómeno que se projeta na sociedade. Jovens sem contacto com a história e as tradições do país tendem a reproduzir estereótipos, a valorizar superficialidades e a ser mais vulneráveis à manipulação. A capacidade de dialogar sobre arte, literatura ou ciência, ou mesmo de reconhecer a riqueza cultural do próprio país, fica comprometida. Além de uma questão académica, trata-se de uma questão de cidadania, uma geração sem referências culturais perde a capacidade de pensar criticamente, de questionar e de inovar.

Este problema assume contornos ainda mais preocupantes quando se olha para o futuro. A criatividade, a inovação e a liderança exigem uma base sólida de conhecimento cultural. Sem ela, a juventude enfrenta limitações na forma como interpreta a realidade e resolve problemas. A ciência e a tecnologia podem fornecer ferramentas, mas são a história, a literatura, a música e as artes que fornecem contexto, visão e sensibilidade.

A solução não passa apenas por acrescentar disciplinas ao currículo, é necessário repensar e  incentivar projetos culturais, debates, visitas a museus e bibliotecas, e integrar conteúdos nacionais de forma transversal de modo a criar pontes entre a escola e a cultura. Ensinar a língua portuguesa não deve significar apagar línguas locais e tradições, estudar história não pode significar ignorar narrativas locais. É necessário restaurar o equilíbrio entre saber técnico e saber cultural, para que a educação não seja apenas preparação para empregos, mas formação para a vida.

A crise invisível da educação em Moçambique é, uma questão de identidade e futuro. Sem cultura geral, arriscamo-nos a criar uma geração técnica, mas culturalmente órfã, preparada para trabalhar, mas pouco capaz de compreender, questionar e transformar a sociedade. Reconhecer este vazio e agir para preenchê-lo é, portanto, uma responsabilidade coletiva. A escola deve ser mais do que um local de ensino de conteúdos, deve ser o espaço onde a juventude aprende a pensar, a sentir e a criar. Só assim poderemos assegurar que o futuro de Moçambique será habitado por cidadãos informados, críticos e culturalmente conscientes.

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