África registou, em 2025, o crescimento mais expressivo da conectividade portuária a nível mundial, com um aumento de 10%, segundo a UNCTAD. O reforço resulta do desvio maciço de navios para o Cabo da Boa Esperança devido à insegurança no Mar Vermelho. Apesar do ganho conjuntural, o continente continua a enfrentar limitações estruturais que penalizam a sua competitividade, como custos logísticos elevados, défice tecnológico e fraca integração regional.
De acordo com o Review of Maritime Transport 2025, o tráfego acrescido beneficiou directamente países costeiros como África do Sul, Moçambique, Tanzânia e Djibouti, que se afirmaram como pontos de passagem obrigatória nas novas rotas globais. Contudo, o impacto económico é ambivalente: o aumento de navios nos portos africanos gerou receitas adicionais de tarifas e serviços portuários, mas também expôs gargalos de eficiência.
Segundo a UNCTAD, o custo médio de transporte e logística em África permanece cerca de 30% superior à média mundial, devido a atrasos nos terminais, burocracia aduaneira e limitações na rede de transporte terrestre. Esta realidade compromete a capacidade de transformar a maior conectividade em ganhos de competitividade e industrialização.
A Zona de Comércio Livre Continental Africana (AfCFTA) surge, neste contexto, como um catalisador. A harmonização de procedimentos aduaneiros e a aposta em corredores transfronteiriços poderão reduzir significativamente os custos logísticos, estimular o comércio intra-africano e atrair investimento externo em cadeias de valor regionais.
Pressões ambientais e climáticas
O relatório da UNCTAD sublinha também o risco de marginalização dos portos africanos no processo de transição energética do transporte marítimo. Apenas uma dezena de portos no continente dispõe de alguma capacidade para abastecimento alternativo (como GNL), quando a frota global já começa a incorporar navios movidos a metanol e amónia. Sem investimentos urgentes em bunkering e em infra-estruturas verdes, África poderá ver limitada a sua competitividade.
A vulnerabilidade climática agrava o quadro: ciclones, inundações e erosão costeira afectam terminais portuários em países como Moçambique e Madagáscar. A UNCTAD recomenda a mobilização de financiamento climático e de parcerias público-privadas para modernizar e proteger infra-estruturas críticas.
Oportunidade estratégica
Apesar dos riscos, a UNCTAD considera que África tem uma janela de oportunidade única. O aumento da conectividade pode servir de alavanca para diversificar exportações, reduzir dependência de matérias-primas brutas e dinamizar a industrialização regional. Para tal, serão necessárias reformas institucionais, melhoria de eficiência portuária e investimentos em tecnologia digital para gestão logística.
Num cenário de crescente disputa por minerais críticos e de redesenho das rotas globais, os portos africanos assumem maior centralidade, mas só colherão benefícios estruturais se forem capazes de transformar o ganho conjuntural em capacidade competitiva de longo prazo.
Fonte: O Económico