A BOLA –Volto aqui à entrevista que te fiz há um ano e dois meses. Nessa altura, o mundo ainda não tinha virado do avesso. Jürgen Klopp ainda era o treinador do Liverpool, tu ainda fazias parte da equipa técnica. Provavelmente, já saberias mais do que eu, sobre o que iria acontecer depois. Mas como é que vês esse momento e como é que vês agora tudo o que se passou?
VÍTOR MATOS – Parece que foi há muito tempo, mas não foi. Foi, acima de tudo, o momento certo para nós. O Jürgen foi muito explícito quando explicou as razões e, também, quando deixou todo o mundo saber da situação, mas sobretudo sentimos que deixámos o clube numa situação melhor do que aquela em que estava quando ele entrou. Esse era o seu grande objetivo: criar uma base para se conseguir ter sustentabilidade e sucesso. Depois, acho que mais ninguém do que nós… Todos estamos muito contentes com o momento atual do clube, porque é, sem dúvida, reconfortante ver o clube a vencer, os jogadores a continuarem a desenvolver-se e a triunfar. Agora, do lado dos adeptos e do lado de fora, isso só nos traz alegria e felicidade.
– Mas estavas à espera que o Arne Slot pegasse na equipa desta maneira e conseguisse ter este sucesso imediato?
– Nisso todo o crédito tem de ser dado ao Arne Slot…
– Lembro-me… Nós falámos na altura, comentámos que a vossa marca era uma marca permanente de muitos anos e quem chegasse ia ter muita dificuldade de pegar, mas, pelos vistos, não foi muito difícil…
– Não, o ponto de partida foi sempre criar uma cultura de vitória, uma cultura de ambição, uma cultura de profissionalismo e isso foi feito e muito bem pelo Arne Slot e pelo Jürgen. O Jürgen, acima de tudo, conseguiu construir e fazer todas as pessoas, incluindo adeptos, acreditar na possibilidade de voltarem a ser o clube gigante que são e ganharem os títulos que se conseguiram ganhar. Agora, todo o crédito tem de ser dado ao Arne Slot por ter sensibilidade para o contexto. Por sentir também qual era o momento em que chegava à equipa e aquilo que considerou importante priorizar para chegar aos poucos àquilo que é a sua ideia de jogo, ao seu estilo.
– Sendo que aí também as diferenças se calhar não eram assim tão grandes quando comparado com outros…
– Sim, quando foi feita a escolha do treinador, acho que esse foi um dos pressupostos para se tentar aproximar ao que existia. É sempre difícil, porque cada treinador tem os seus valores, princípios e, ao mesmo tempo, a sua personalidade. Se calhar, em termos macro, existiam muitas semelhanças entre aquilo que era o Feyenoord do Arne Slot e o Liverpool, mas esta sensibilidade inicial para o contexto foi muito importante. Vemos a forma como a equipa foi, aos poucos, ficando mais maturada naquilo que é a ideia do Arne Slot, enquanto conseguia ter sucesso e manter-se competitiva. E isso é algo que nos reconforta. É, sem dúvida, para nós incrível, mesmo estando fora, poder vibrar com muitos jogos como os que têm feito até aqui.
– Vocês ainda falaram com ele?
– Não, eu não falei. O Arne Slot tinha já uma relação com o Pep [Lijnders]. O Jürgen, publicamente também já referiu que falaram, mas são conversas que ocorrem mais entre treinadores principais.
– Porque tu fazias a ligação para as camadas jovens mais próximas dos seniores…
– Sim, sim. Era um dos treinadores da equipa principal e essa era uma das funções: ligar aquilo que é a formação do clube à primeira equipa e, ao mesmo tempo, ser suporte ao Jürgen no treino e nas decisões que ele precisaria tomar juntamente com o Pep.
– Por isso não achaste estranho que ele não tivesse tentado falar? A verdade é que ele também não tem utilizado grandes nomes da formação que estejam só a chegar agora, não é?
– Foi uma preocupação clara nossa deixar este caminho interno daquilo que é a formação para a equipa principal estruturado. O diretor da academia manteve-se, que é o Alex Inglethorpe, e o clube quis dar continuidade à função que eu desempenhava e contratou o Aaron Briggs, um colega meu, que tirou curso comigo no País de Gales. E, ao mesmo tempo, foi procurando estruturar também a função de outra forma, dando-lhe outra profundidade, o que eu acho que foi o caminho certo a fazer.
Fonte: A Bola