“Esse carro não anda”: Uma Responsabilidade Partilhada

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Por: Sara Seda

“Esse carro não anda!” é uma frase que ressoa com frequência dentro dos transportes públicos, especialmente nos momentos de maior pressão. A maioria de nós já a ouviu, ou até a disse. Mas quantos de nós param para pensar sobre o que realmente está por detrás dessa queixa?

Vivemos numa realidade urbana marcada pelo trânsito intenso, infra-estruturas deficitárias e um sistema de transporte muitas vezes sobrecarregado. Não somos novatos nisto, conhecemos as vias degradadas, a escassez de vias de acesso eficientes e, principalmente, os horários de pico que tornam a mobilidade num verdadeiro desafio.

Ainda assim, continuamos a exigir milagres dos motoristas. Um trabalhador que precisa entrar às 8h e decide sair de casa às 7h30, esperando chegar ao destino às 7h20, vive na ironia do impossível.  O trânsito é, em grande parte, algo que foge ao nosso controlo. No entanto, sair de casa com antecedência, planeando o percurso com margem para imprevistos, é da nossa inteira responsabilidade. A pressa, quando convertida em pressão sobre quem conduz, é muitas vezes a origem de tragédias que podiam ser evitadas, e quando o relógio avança mais rápido do que o autocarro, ouvimos em coro: “Esse carro não anda”.

Curiosamente, aplaudimos quando o motorista faz uma ultrapassagem ousada, conduz em contramão ou ultrapassa o limite de velocidade. Consideramo-lo um herói da nossa pontualidade. Porém, quando esse mesmo excesso resulta num acidente, quando um peão é atropelado ou o veículo se envolve numa colisão, rapidamente apontamos o dedo: “Esses motoristas são irresponsáveis!”

É necessário reconhecer que alguns motoristas ao volante já têm o hábito de desrespeitar as regras, mesmo sem qualquer pressão externa. No entanto, não podemos ignorar que muitos desses comportamentos são também alimentados pela impaciência e exigência dos próprios passageiros. O medo de perder utentes e, consequentemente, rendimento, leva muitos motoristas a ceder à tentação de atalhos perigosos.

É verdade que nem sempre a culpa é apenas dos passageiros. Há motoristas e cobradores que, sobretudo em horário de ponta, perdem minutos preciosos a tentar convencer pessoas a entrarem no transporte, algo desnecessário nessas horas, pois quem está na paragem já sabe para onde vai. Esta prática contribui para atrasos evitáveis, mas nunca deve ser compensada com excesso de velocidade ou manobras imprudentes.

É tempo de reflectirmos: será que, ao exigir velocidade em vez de segurança, não estamos também a ser cúmplices silenciosos dos acidentes nas estradas? A segurança rodoviária é uma construção colectiva.

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