Galp e o Estado Moçambicano: Imposto, Negação e um Jogo de Força pela Soberania Fiscal

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FOTO: MZNews

Por: Alfredo Júnior 

A Autoridade Tributária de Moçambique (AT) quebrou o silêncio e veio a público garantir que não existe qualquer divergência fiscal com a petrolífera portuguesa Galp relativamente a 162 milhões de euros. Uma declaração firme, que pretende passar a imagem de tranquilidade e de alinhamento com os investidores.

Mas por trás do discurso oficial, há um enredo mais denso. Segundo o Centro de Integridade Pública (CIP), a AT notificou a Galp para pagar precisamente esses 162 milhões, resultado de um imposto sobre mais-valias pela venda de 10% da sua participação na Área 4 à petrolífera estatal dos Emirados Árabes Unidos, a ADNOC. O valor exigido decorre de uma taxa efetiva de 17,6% sobre uma mais-valia estimada em 920 milhões de euros.

Do outro lado, a Galp não só contesta a conta como apresenta uma matemática diferente: segundo a empresa, a mais-valia tributável não ultrapassa os 26 milhões de euros, 35 vezes menos do que a exigência da AT. E a disputa não ficou no plano nacional. A petrolífera portuguesa levou o caso para arbitragem internacional no ICSID, invocando cláusulas de estabilização contratual que, na prática, procuram blindar as empresas contra mudanças fiscais.

O CIP interpreta esta disputa como um teste à soberania económica de Moçambique. O risco, segundo a organização, é que um precedente a favor da Galp incentive outras multinacionais a recorrer a mecanismos internacionais para escapar ao fisco local, fragilizando ainda mais a capacidade do Estado de arrecadar receitas num setor estratégico.

No cruzamento dos problemas, sobressaem dois eixos: por um lado, a comunicação oficial da AT, que insiste na inexistência de litígio, criando um contraste visível com os relatos de organizações da sociedade civil, por outro, a dependência de Moçambique de grandes investimentos estrangeiros, que muitas vezes vêm acompanhados de cláusulas que limitam a autonomia fiscal do país.

Enquanto a AT fala em tranquilidade, a Galp fala em direito contratual, e o CIP fala em soberania, a verdadeira questão permanece: quem dita as regras do jogo quando o petróleo e o gás estão em causa, o Estado soberano ou o investidor multinacional?

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