A Índia lançou um pacote de investimentos no valor de 18 mil milhões de dólares para construir uma indústria doméstica de semicondutores e reduzir a dependência de importações num sector crucial para a segurança tecnológica e económica. O ambicioso plano procura posicionar o país como alternativa à China na cadeia global de chips, mas enfrenta limitações de talento, infra-estruturas e maturidade institucional.
A chamada Missão Semicondutores do Governo indiano pretende criar uma cadeia de valor completa no país, desde o design até à produção, teste e embalagem de chips. O objectivo é garantir fornecimento a sectores estratégicos — incluindo inteligência artificial, defesa, telecomunicações, veículos eléctricos e energias renováveis — ao mesmo tempo que atrai investimento global num momento em que os EUA e a União Europeia procuram diversificar as suas cadeias longe da China.
Até agora, foram aprovados 10 projectos em seis estados, com destaque para a fábrica de 11 mil milhões USD que a Tata Electronics está a construir em Gujarat, em parceria com a taiwanesa Powerchip Semiconductor Manufacturing Corporation (PSMC). A unidade produzirá chips para gestão de energia, microcontroladores e circuitos lógicos de alto desempenho, utilizados em IA, automóveis, computação e armazenamento de dados.
Outros projectos incluem a criação de fábricas de semicondutores compostos em Odisha e múltiplas unidades de teste e embalagem (OSAT), um segmento de investimento mais acessível e de margens atractivas. Segundo a PwC Índia, esta pode ser a porta de entrada do país no ecossistema global, mesmo antes de se posicionar no fabrico de chips de última geração.
No entanto, especialistas alertam que os desafios são profundos. A Índia não possui ainda uma base consolidada de fornecedores de químicos de ultra-alta pureza, essenciais para fábricas de chips, e enfrenta obstáculos logísticos e regulatórios. A nível de talento, embora exista mão-de-obra qualificada em design, a experiência prática em fabrico e testes de ponta é ainda reduzida.
Outro ponto crítico prende-se com a propriedade intelectual (PI). A maioria das patentes e tecnologias avançadas continua concentrada em centros como os EUA, Taiwan e Singapura. Analistas defendem que a Índia terá de modernizar o seu regime de PI e reforçar os mecanismos de aplicação da lei para competir com jurisdições mais maduras.
Apesar dos desafios, o governo de Narendra Modi está a oferecer incentivos financeiros generosos, cobrindo até 50% dos custos de fábricas e unidades de teste. A política já atraiu interesse de empresas de Taiwan, Reino Unido, EUA e Coreia do Sul. Ainda assim, especialistas advertem que tais incentivos não são sustentáveis a longo prazo e só terão impacto se forem acompanhados por reformas estruturais.
Os próximos 3 a 4 anos serão decisivos. A capacidade da Índia para colocar em funcionamento fábricas de silício, consolidar o ecossistema de fornecedores e afirmar-se como player credível determinará se a aposta de 18 mil milhões USD poderá transformar o país num pólo relevante na indústria global de semicondutores.
Fonte: O Económico