Moçambique definiu novas prioridades económicas e regulatórias para os sectores de minas, energia e combustíveis, combinando reformas jurídico-legais com projectos estruturantes de grande escala. O Governo estima que apenas para a electrificação universal serão necessários mais de US$ 7,6 mil milhões até 2030. O objectivo é consolidar a soberania económica, ampliar a participação nacional nos recursos estratégicos e assegurar que a riqueza mineral e energética se traduza em desenvolvimento inclusivo e sustentável.
Energia: electrificação universal como motor de transformação
No encerramento do 10.º Conselho Coordenador do MIREME, o ministro Estevão Rafael Pale destacou o papel transformador do Projecto Hidroeléctrico de Mphanda Nkuwa, cuja componente social prevê investimentos de US$ 3 mil milhões em electrificação comunitária e desenvolvimento local, beneficiando 7.000 pessoas nos distritos de Chiúta, Marara e Cahora Bassa.
Simultaneamente, o programa Energia para Todos tem como meta ligar 3,4 milhões de famílias até 2030, o que exigirá US$ 4,6 mil milhões em financiamento. Este esforço será viabilizado por instrumentos como a Taxa de Acesso Universal e pela adesão de Moçambique à Mission 300, iniciativa internacional que mobiliza recursos para garantir acesso universal à energia no continente africano.
O ministro sublinhou que estes investimentos permitirão não só a expansão da electrificação doméstica, mas também a criação de condições para a industrialização, a expansão do agro-processamento e a dinamização das pequenas e médias empresas locais.
Quadro legal mineiro e petrolífero: soberania e captação de valor interno
A revisão da Lei de Minas marca uma viragem na política de recursos naturais: o Estado passa a deter participação mínima de 20% em projectos de minerais críticos e estratégicos, assegurando maior controlo sobre activos de importância vital para a transição energética global.
No sector petrolífero, a Lei dos Petróleos foi ajustada para aumentar a quota de participação das empresas nacionais no financiamento até à fase de produção, permitindo que os benefícios económicos sejam captados mais cedo e garantindo que o upstream impulsione a industrialização nacional.
Já a proposta de Lei do Conteúdo Local está em fase de harmonização, com enfoque na sustentabilidade institucional e na articulação com os grandes projectos de gás da Bacia do Rovuma, onde operam a TotalEnergies, a ExxonMobil e a ENI. O ministro defendeu que a lei seja clara quanto às competências institucionais, ao papel da futura agência e do INP, e ao alcance nos megaprojectos.
Combustíveis: receitas fiscais em alta, mas mercado fechado
No domínio dos combustíveis, os resultados do Programa de Marcação foram considerados encorajadores: houve reforço da colecta fiscal, maior controlo sobre stocks e reservas domésticas e uma redução significativa do contrabando. Contudo, Pale alertou que o quadro regulatório ainda carece de reformas adicionais, incluindo medidas mais duras contra o contrabando e a revisão do modelo de importação, que actualmente limita a entrada de novos operadores e a competitividade do mercado.
Em paralelo, o Programa Incentivo Geográfico cumpriu a meta de instalar 119 postos de abastecimento em todas as sedes distritais, melhorando o acesso ao combustível em todo o território nacional. O desafio, segundo o ministro, é agora assegurar a sustentabilidade e rentabilidade destes activos, ajustando o modelo de gestão e operação.
Execução institucional: avanços e lacunas
O balanço da execução sectorial mostra sinais positivos. No primeiro semestre de 2025, 79% das actividades previstas foram cumpridas ou parcialmente cumpridas, contra 21% que ficaram por implementar devido a constrangimentos administrativos e institucionais. Já no seguimento do 9.º Conselho Coordenador, 57% das decisões tinham sido executadas, 19% encontravam-se em curso e 24% permaneciam sem progresso.
Para o ministro, estes números revelam progresso, mas também a necessidade de maior disciplina de execução e inovação administrativa para ultrapassar obstáculos que atrasam projectos estruturantes.
As reformas e investimentos anunciados alinham-se ao Plano Quinquenal do Governo 2025–2029 (PQG) e à Estratégia Nacional de Desenvolvimento (ENDE 2025–2044), reflectindo a ambição de transformar a riqueza mineral e energética em prosperidade partilhada. “O nosso principal objectivo é que cada moçambicano — do pequeno operador ao grande investidor — sinta-se incluído neste processo de transformação”, afirmou Pale.
A aposta na soberania sobre minerais críticos, na electrificação universal e na transparência do mercado de combustíveis sublinha a intenção do Governo de converter recursos naturais em capital económico e social duradouro, consolidando Moçambique como um actor estratégico no mercado energético regional e global.
Fonte: O Económico