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Multilateralismo em Mutação: O Peso Económico Desloca-se Para o Sul Global e Reabre a Disputa Pela Liderança Mundial

Resumo

As reflexões de Danny Quah sobre o deslocamento do "centro de gravidade económico" do Ocidente para o Indo-Pacífico são destacadas em eventos recentes como a Cimeira do G-20 em Joanesburgo e a Cimeira UA-UE em Luanda. África e Ásia emergem como atores-chave no poder político e económico global, indicando uma mudança significativa no discurso internacional. Quah argumenta que as instituições multilaterais, como o FMI e o Banco Mundial, não acompanharam esta mudança estrutural, mantendo-se presas a um passado onde o poder económico estava concentrado no Atlântico Norte. A crescente importância de África e Ásia devido a fatores demográficos, urbanização e recursos estratégicos redefine a economia mundial, desafiando a relevância das atuais instituições internacionais.

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p style=”margin-top: 0in;text-align: justify;background-image: initial;background-position: initial;background-size: initial;background-repeat: initial;background-attachment: initial”>As reflexões de Danny Quah sobre o “centro de gravidade económico” ajudam a explicar o novo ambiente geopolítico revelado na Cimeira do G-20 em Joanesburgo e na recente Cimeira UA–UE em Luanda, onde ficou evidente que o poder político, económico e narrativo do mundo se move rapidamente para África e Ásia.

O discurso global sobre poder económico, influência política e governação internacional está a mudar de forma acelerada. As reflexões de Danny Quah sobre o “centro de gravidade da economia mundial” — que desde 1980 se tem deslocado constantemente do Ocidente para o Indo-Pacífico — ajudam a interpretar o que aconteceu na Cimeira do G-20 em Joanesburgo e na Cimeira UA–UE em Luanda: o multilateralismo está em mutação profunda e o Sul Global deixou de ser espectador para se tornar actor decisivo na arquitectura política e económica internacional.

A tese de Danny Quah: o mundo mudou, mas as instituições ainda vivem no passado

Danny Quah demonstra, com base em modelos geoeconómicos, que o centro económico mundial mudou de forma estrutural. Em 1980, o “centro de gravidade” da economia global situava-se no Atlântico Norte. Hoje, deslocou-se milhares de quilómetros para leste, ancorado na Ásia, com África a ganhar peso crescente graças à demografia, urbanização, mercados emergentes e riqueza de recursos estratégicos. Esta mudança não é conjuntural: é estrutural, persistente e redefine os fundamentos da economia mundial.
Quah alerta que, apesar desta realidade geofísica e económica, as instituições multilaterais — FMI, Banco Mundial, OMC e mesmo o G-20 — continuam a reflectir um passado que já não existe. As quotas, as prioridades de financiamento e as normas foram concebidas num período em que a economia global era dominada por Washington, Londres, Bruxelas e Tóquio. O Sul Global, que hoje concentra a maior parte do crescimento e da procura, continua sub-representado.

G-20 em Joanesburgo: o Sul Global assume a iniciativa diplomática e confronta a ordem existente

A Cimeira do G-20 em Joanesburgo — a primeira realizada no continente africano — confirmou esta mudança. África deixou de ser apenas tema da agenda para ser anfitriã, promotora e participante activa de debates sobre governação financeira internacional, segurança energética e regras do comércio global.
O encontro ficou marcado pela pressão conjunta de África, Índia, Indonésia, Brasil e Arábia Saudita para uma reforma efectiva das Instituições Financeiras Internacionais. A mensagem foi clara: um sistema financeiro global desenhado na década de 1940 já não responde às necessidades de economias com crescimento acelerado e exigências de financiamento maciço para infra-estruturas, energia, industrialização e adaptação climática.
A cimeira expôs também um dado político essencial: o Ocidente já não controla a narrativa global sobre desenvolvimento. A defesa de um novo pacto financeiro internacional foi conduzida por países do Sul, e a Europa e os EUA viram-se obrigados a posicionar-se defensivamente num debate que outrora lideravam.

Cimeira UA–UE em Luanda: África afirma-se como parceira estratégica, não como beneficiária

A Cimeira UA–UE em Luanda reforçou a mesma tendência. As intervenções revelaram uma África mais assertiva, consciente da sua centralidade energética, demográfica e geoeconómica. A UE, confrontada com fragilidades industriais, desafios migratórios e dependências externas, procura uma parceria mais pragmática com África, ancorada em segurança, energia, industrialização e competitividade.
Em Luanda ficou evidente que África exige que a cooperação seja construída sobre interesses comuns, não sobre relações hierárquicas. Temas como migração, energia, transição verde, industrialização e segurança foram enquadrados como áreas de convergência e não de condicionalidade. Este discurso coincide com a análise de Danny Quah: África não procura benevolência — procura inserção estratégica numa economia global em reconfiguração.

A disputa central: quem define as regras da economia mundial?

O que une as leituras de Quah aos eventos do G-20 e da UA–UE é a disputa por poder normativo. O “centro de gravidade económico” não é apenas um conceito geográfico; é um elemento de poder político.
Quem concentra produção, população, tecnologia e energia tende a influenciar as regras do comércio, dos fluxos financeiros, da digitalização, das cadeias de valor e da geopolítica.
A ascensão de economias asiáticas e africanas redefine esta distribuição de poder. O Ocidente procura preservar instituições e normas criadas durante a sua hegemonia; o Sul Global quer reescrevê-las para reflectir a nova realidade económica. O multilateralismo tradicional, que serviu como árbitro e coordenador global durante décadas, já não consegue mediar interesses divergentes com a mesma eficácia. Surge uma nova fase, marcada por alianças flexíveis, geoeconomia competitiva e disputas por legitimidade.

Da retórica à realidade: o multilateralismo entra numa era de fragmentação organizada

As duas cimeiras recentes confirmam que o multilateralismo já não é uma arquitectura estável, mas um campo de disputa. A crescente sobreposição de fóruns — G-20, BRICS+, UA–UE, APEC, ASEAN, COP, quadros regionais de segurança e plataformas financeiras alternativas — mostra que o sistema está a transitar de uma ordem única para um ecossistema multipolar.
Nesta fase, diferentes blocos procuram definir normas próprias, competir por financiamento, moldar cadeias de valor e dominar narrativas globais. A análise de Quah ajuda a perceber esta fragmentação: quando o poder económico muda de lugar, as instituições que o regulavam também mudam — ou são forçadas a fazê-lo.

O que isto significa para África — e para Moçambique

África encontra-se no epicentro desta transformação. A sua demografia, recursos naturais, integração continental e profundidade do mercado tornam o continente indispensável para qualquer arquitectura económica global. A Cimeira UA–UE deixou claro que o continente se vê como investidor, produtor e actor normativo.
Moçambique, pelos seus recursos energéticos, localização estratégica e integração regional, não está fora desta equação. As disputas globais sobre energia, transição, financiamento e segurança são directamente relevantes para o país.
Ter consciência do deslocamento do centro económico global e das tensões do multilateralismo é essencial para uma política externa assertiva, para a mobilização de investimentos e para a integração nas cadeias de valor emergentes.

A análise de Danny Quah e os sinais vindos de Joanesburgo e Luanda convergem para o mesmo diagnóstico: o mundo entrou numa era multipolar em que África e Ásia ocupam posições centrais. O multilateralismo não desaparece, mas transforma-se — e o equilíbrio de poder global dependerá cada vez mais da capacidade do Sul Global impor a sua voz na definição das regras económicas internacionais.

Fonte: O Económico

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