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O Governo moçambicano admite que a reabilitação da Estrada Nacional Número Um (N1) enfrenta entraves financeiros sérios e só poderá ser concretizada gradualmente, mediante mobilização faseada de fundos e priorização de troços mais críticos. Enquanto o financiamento integral continua por assegurar, as autoridades avançam com obras de manutenção de emergência e reabilitação faseada, numa tentativa de evitar o colapso de uma infra-estrutura essencial para a coesão económica e territorial do país.
A N1, com 2.620 quilómetros de extensão, atravessa o país do Sul ao Norte, ligando Maputo a Pemba e servindo como espinha dorsal da mobilidade nacional. A sua importância logística é inquestionável, tanto para o transporte de bens e serviços como para a circulação de pessoas em todo o território nacional. No entanto, o seu estado actual de degradação já compromete níveis mínimos de transitabilidade.
Na sua intervenção à Assembleia da República, o ministro João Matlombe reconheceu que a reabilitação total exige 3,5 mil milhões de dólares norte-americanos, dos quais apenas 1,1 mil milhões estão até agora garantidos — com cerca de 800 milhões USD mobilizados junto de parceiros de cooperação e 300 milhões em processo de angariação.
O plano governamental para lidar com esta situação prevê intervenções de curto, médio e longo prazo:
“A degradação da N1 atingiu níveis incompatíveis com a segurança rodoviária e o desenvolvimento logístico. O Governo compromete-se com um plano estratégico de cinco anos para assegurar, pelo menos, a transitabilidade mínima”, afirmou o ministro.
Impacto das Calamidades Naturais e da Fragilidade Orçamental
O Ministério dos Transportes e Logística assinala que eventos climáticos extremos têm tido impacto directo nos activos rodoviários, com destaque para os ciclones Idai, Kenneth, Judy e outras depressões tropicais. Entre 2012 e 2025, os custos de reposição da rede viária devido a desastres naturais ultrapassaram os 650 milhões USD.
Paralelamente, manifestações violentas e a redução da receita nas portagens — resultado da suspensão temporária do princípio utilizador/pagador — agravaram o défice de financiamento para estradas. O valor dos activos rodoviários passou de 10,4 mil milhões USD em 2017 para 8,2 mil milhões USD em 2024, reflectindo um declínio na capacidade de conservação e investimento.
Uma Estratégia a Ser Testada
A estratégia do Governo assenta na reabilitação progressiva, alavancada por financiamentos faseados. Na primeira fase, serão reabilitados 508 km da N1, utilizando 400 milhões USD já disponibilizados por parceiros. A ambição é clara, mas a execução dependerá de factores externos e internos — desde a estabilidade financeira à capacidade de mobilização do sector privado.
Adicionalmente, está em curso um projecto executivo para reabilitação dos troços Benfica–Zimpeto e 3 de Fevereiro–Incoluane em Maputo, num total de 24 km, com financiamento de 50 milhões USD.
“Estamos a priorizar troços críticos. A solução integral depende de factores orçamentais e da resposta dos nossos parceiros”, declarou João Matlombe.
A reabilitação da N1 é um teste à capacidade do Estado moçambicano de planear, negociar e executar projectos de infraestrutura de forma estratégica. O desafio é garantir que as intervenções pontuais actuais não se tornem permanentes, perpetuando o ciclo de degradação. Com um financiamento ainda incompleto, uma rede viária vulnerável e uma economia que depende da logística rodoviária, Moçambique joga nas estradas parte da sua recuperação económica e da sua coesão territorial.
Fonte: O Económico