Por: Alfredo Júnior
A tensão no Niassa voltou a expor a fragilidade da presença do Estado no norte do país. Os ataques recentes, que geraram medo, deslocamentos e destruição de infraestruturas, revelam que a insegurança já não está confinada a Cabo Delgado e que a violência se move sempre que encontra território com pouca proteção institucional. Foi neste contexto que Daniel Chapo apelou ao reforço da vigilância e à união nacional para enfrentar o terrorismo, numa mensagem que, embora importante, levanta questões profundas sobre a capacidade real do Estado de garantir segurança efectiva.
Quando um presidente apela à vigilância comunitária, o gesto pode ser interpretado de duas formas. Por um lado, traduz uma tentativa de envolver as populações numa estratégia de proteção colectiva. Por outro, deixa transparecer que o aparelho estatal tem limitações numa província extensa, com estradas em mau estado, aldeias dispersas, patrulhamento irregular e serviços públicos frágeis. O Niassa sempre foi uma região com presença limitada do Estado, e a violência recente apenas tornou mais visível algo que as comunidades já sabiam: quando o Estado chega tarde ou chega pouco, a insegurança avança.
O ataque que abalou a província não teve apenas impacto material. Ele afectou famílias, trabalhadores locais, guardas ambientais, operadores de turismo e comunidades que vivem entre a esperança de desenvolvimento e a realidade de abandono. O deslocamento de pessoas, a interrupção das actividades económicas e o medo permanente representam um custo humano que muitas vezes fica fora do discurso oficial. A vida no Niassa é marcada por desafios históricos, e a expansão do terrorismo acrescenta uma camada de instabilidade a quem já vive no limite.
O apelo à união surge num momento em que o país precisa de coesão, mas não basta para resolver problemas estruturais. A unidade só é possível quando as populações sentem que o Estado está ao seu lado de forma constante, não apenas no discurso. Para enfrentar o terrorismo de forma séria, é preciso garantir presença, investimento social, reabilitação de serviços, reforço das forças de segurança e inclusão das comunidades nas decisões. Sem isto, a vigilância popular arrisca transformar-se numa tentativa de compensar falhas institucionais antigas.
O que acontece no Niassa também serve de espelho para o país. Moçambique tem recursos naturais, potencial económico e riqueza ambiental, mas continua a enfrentar dificuldades em transformar esses elementos em segurança, desenvolvimento e estabilidade. Onde o Estado está ausente, o conflito encontra espaço. Onde o desenvolvimento não chega, a violência conquista terreno.
O discurso de Daniel Chapo é um alerta importante, mas não pode ser a única resposta. A vigilância comunitária pode apoiar, mas não substitui a governação efectiva. A situação no Niassa exige mais do que apelos: exige políticas consistentes, presença contínua e decisões que consolidem o Estado nos territórios onde ele ainda é percebido como uma promessa distante.






