Resumo
José Pereira Coutinho, em "Religião e outros conceitos", considera a religião como um sistema abrangente de crenças, práticas e valores que deveriam promover uma sociedade mais justa e solidária. No entanto, muitas vezes, as práticas religiosas contradizem estes ideais, com indivíduos que, apesar de se mostrarem fervorosos nas suas crenças, agem de forma corrupta e intolerante fora dos locais de culto. Líderes religiosos e governantes que se dizem piedosos muitas vezes são acusados de agir com ganância, corrupção e desrespeito. Esta deturpação da religião como instrumento político e moral é criticada, defendendo-se que a fé deve ser avaliada pelos seus frutos práticos e não apenas por discursos e rituais vazios.
Na visão substantiva de José Pereira Coutinho, conforme exposta na obra “Religião e outros conceitos”, a religião é compreendida como um sistema abrangente que envolve crenças, práticas, valores e instituições organizadas. Um ponto relevante dentro dessa concepção diz respeito às práticas religiosas, que deveriam ser uma via para a transformação e para a construção de uma sociedade mais justa, passiva e solidária.
As grandes tradições religiosas, em geral, pregam valores universais como o amor ao próximo, a humildade, o perdão, a solidariedade e a busca pela justiça. No entanto, o que se vê na prática, muitas vezes, é o oposto, uma fé usada como fachada, como escudo moral para justificar comportamentos que em nada se assemelham aos ensinamentos que essas mesmas pessoas dizem seguir.
É comum ver indivíduos ‘’extremamente’’ religiosos dentro das igrejas, templos ou cultos, levantando as mãos aos céus, clamando por pureza e condenando aqueles que vivem de forma diferente em relação a aquilo que eles consideram “correcto”. Mas basta sair das paredes sagradas, a realidade se revele, agressões dentro do lar, intolerância com os filhos, traições, corrupção, preconceitos e julgamentos constantes. Há uma profunda contradição entre o discurso e a prática.
Muitos dos que ocupam posições privilegiadas nas instituições religiosas, pastores, padres, bispos e até entre os chamados “fiéis exemplares” agem com uma moral selectiva, que serve mais aos seus próprios interesses do que ao bem comum. Pregam o amor ao próximo, mas rejeitam o diferente. Falam de paz, mas incitam ódio contra minorias. Condenam a violência, mas a praticam dentro de casa. Quantos casos já ouvimos de líderes religiosos que exploram a fé alheia para enriquecer? Infelizmente, são muitos.
Actualmente, não se sabe a diferença real entre os crentes e os ateus, a diferença está apenas na frequência aos cultos. Os crentes vão à igreja aos domingos, de fato e com gravata, com a Bíblia debaixo do braço. Mas esses que se intitulam religiosos não praticam os mandamentos recomendados. São corruptos, egoístas, gananciosos, desrespeitosos e a falsidade reside neles. A fé que deveria produzir frutos diferentes tornou-se apenas uma aparência.
Esse comportamento hipócrita também se reflecte na esfera pública. A maioria dos nossos governantes se diz “temente a Deus”. Usam versículos bíblicos em seus discursos, aparecem em cultos e colocam a fé como símbolo de moralidade. No entanto, as suas práticas são repletas de ganância, mentira, corrupção e desprezo pelo povo. Não há nada de cristão em desviar dinheiro público, em enriquecer às custas da miséria da população, em fechar os olhos para o sofrimento dos mais pobres. A fé, nesse caso, vira instrumento político, usado para manipular e conquistar votos, não para guiar condutas.
Deste modo, é preciso dizer: não é a religião em si o problema. O problema é a deturpação que se faz dela. É o contraste entre o que se prega e o que se vive. Fé sem prática é apenas teatro.
Não é possível construir um mundo melhor enquanto a religião for usada como escudo para encobrir atitudes cruéis e desumanas. É hora de parar de idolatrar discursos bonitos e começar a observar os frutos das acções. Porque, como diz a escritura bíblica: “Pelos seus frutos os conhecereis.” (Mateus 7:16), reforçando a ideia de que uma pessoa ou doutrina religiosa não deve ser avaliada apenas pelas palavras, rituais ou aparências, mas sim pelos resultados práticos, ou seja, os frutos que produzem.