‘Livre e Direto’ é o espaço de opinião semanal do jornalista Rui Almeida
Primeira constatação: 75 por cento da vontade expressa pelos 84 delegados com direito a voto na Assembleia Geral da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) representa uma margem inequívoca, indiciadora de uma vontade muito sólida de opção pelos projetos e propostas da lista encabeçada por Pedro Proença.
O antigo árbitro internacional passa, assim, da Liga Portugal para a FPF, como tinha estrategicamente definido há mais de um ano, com o suporte de uma boa parte dos clubes profissionais de futebol, de um número significativo das associações distritais com direito a voto e de alguns representantes de classes representativas de outras áreas do futebol português.
Herda uma condição federativa próxima (muito próxima) da excelência. Nos treze anos de mandato protagonizados por Fernando Gomes como líder do organismo gestor do futebol nacional, muito mudou, muito evoluiu, quer na componente organizativa e estrutural, como na vertente desportiva, entendendo como tal todo o edifício formativo e competitivo, no futebol e no futsal masculinos e femininos, e no futebol de praia.
Com capitais próprios, no início do consulado de Gomes, de cerca de 28 milhões de euros, a FPF mais do que duplicou o seu património ao longo dos últimos anos. Ele cifra-se, agora, nos 57 milhões de euros. E se olharmos do lado da receita, ela era, em 2012, de 47,5 milhões de euros, enquanto o ano de 2024, por exemplo, termina com um exercício de rendimento de 122 milhões de euros, o maior de sempre da instituição.
Estes são apenas alguns dos mais simples e diretos parâmetros financeiros de avaliação e constatação do crescimento exponencial da federação e, com ele, de toda a dinâmica de evolução do futebol português. As receitas provenientes da publicidade, do Placard, de direitos de transmissão e de subsídios garantem a Proença e à sua equipa uma almofada confortabilíssima para o arranque do seu mandato quadrienal.
Os desafios colocam-se em vários parâmetros, e são de inegável monta. Desde logo, tentar fazer melhor do ponto de vista da massificação do jogo e do rendimento desportivo apresentado pelas diversas Seleções Nacionais. E isso, embora não impossível, afigura-se muito complicado, depois das conquistas das representações nacionais de futebol e futsal. Mesmo ao nível do futebol feminino, a aposta terá de ser continuada no melhoramento da fórmula e da competitividade das provas, na captação de talentos e no apoio reforçado às associações distritais (as verdadeiras alavancas do futebol em Portugal…) para que os programas de suporte e de sedução do jogo no feminino possam ter continuidade.
Por outro lado, Pedro Proença sabe que o futebol não se escreve apenas com os clubes profissionais, com a elite, a competição internacional e a representatividade portuguesa nos principais areópagos de decisão a nível europeu e mundial.
Sendo inegável que a sua recente experiência à frente da estrutura representativa das ligas europeias, e a sua muito significativa carreira como juiz internacional (dirigindo, no mesmo ano de 2012, as finais da Liga dos Campeões, em Munique, e do Europeu, em Kiev), são elementos talvez determinantes na posição institucional do futebol português no cotejo planetário, o essencial é justamente virar agulhas para outras prioridades, que aproximem o novo presidente da realidade mais intrínseca do jogo em Portugal. Junto dos clubes dos escalões inferiores, das paisagens de associações de futebol mais remotas, das escolas, dos adeptos.
Não foi junto destes — dos adeptos — uma escolha pacífica, e tal ficou bem patente nas cruzadas e frequentes discussões em sede de redes sociais, nos últimos dias. Valerá o que vale, mas o estigma da manutenção de um conjunto de interesses instalados e da sua recorrente proteção, seja do ponto de vista corporativo, seja no campo das influências e do lobby, terá de merecer, da parte do antigo árbitro, um olhar especial. A arbitragem, enquanto classe, está de resto reforçada nos órgãos sociais agora eleitos, e tal facto, obviamente, gera alguma desconfiança da parte das bases organizativas e, igualmente, dos adeptos e amantes do jogo em Portugal.
Sei que Pedro terá tudo isto em consideração, em face da experiência que foi acumulando e da sua própria perceção do fenómeno. Ele sabe o que herdou, o peso que tem, neste momento, o lugar que ocupa, o quão influenciador pode ser nos segmentos de boa governança e transparência, e talvez a sua primeira medida passe exatamente por tentar apaziguar eventuais crispações, motivar a muito profissional, competente e dedicada equipa da Federação Portuguesa de Futebol, e estimular um clima de alguma paz que lhe permita estar atento a todos os ângulos de um desafio tão complexo como fascinante.
Uma palavra essencial a Nuno Lobo: coragem. Foi isso mesmo que o antigo presidente da Associação de Futebol de Lisboa teve, após completar a sua tarefa na instituição da capital. Coragem de dar a cara, de apresentar um projeto disruptivo e voltado para as bases do futebol em Portugal, de questionar e de pretender trazer à colação as matérias que, incontornavelmente, passam a partir da próxima semana a fazer parte dos problemas e preocupações de Proença.
Teria sido essencial o debate. Que o seja agora, depois de uma vitória que não deixa dúvidas, mas que, para ser plena, não pode ser unanimista e centralista, terá de ser inclusiva e agregadora.
É um dos melhores jogadores da Real Sociedad, e tem sido fundamental na carreira da equipa de Imanol Alguacil, quer na liga espanhola quer, mais recentemente, nas competições europeias. O japonês Takefusa Kubo deu esta semana uma lição de ética, mostrando porque, no país do sol nascente, esse conceito é estruturante da vida humana. Rejeitou uma proposta milionária da Arábia Saudita para uma transferência que o faria ficar entre os mais bem pagos da liga saudita. E explicou que gosta do «futebol bonito», e não do «futebol rico». Um golo de levantar estádios!
Para quem segue o futebol português e o trabalho que tem sido feito ao nível das associações distritais, o nome de Reinaldo Teixeira é familiar. Presidente da Associação de Futebol do Algarve, anunciou a sua candidatura à presidência da Liga Portugal. Gestor muito experiente, dirigente arrojado mas aglutinador, representa uma boa notícia para a eventual gestão do organismo que gere as competições profissionais de futebol em Portugal. Pode nem vir a ganhar um ato eleitoral que, decerto, será muito apetecido, mas, ao longo dos anos, ganhou o respeito de quem o conhece por ter ideias e conseguir concretizá-las. O que já não é pouco…
Fonte: A Bola