S&P desce rating da dívida interna de Moçambique e agrava perspectiva económica

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A agência de notação financeira Standard & Poor’s (S&P) reviu em baixa a classificação da dívida interna de Moçambique, reduzindo o rating para CCC-, enquanto manteve inalterada a avaliação da dívida externa, mas alterou a sua perspectiva para negativa. A decisão surge num contexto de crescentes desafios económicos, marcados por desequilíbrios orçamentais, dificuldades de liquidez e incertezas políticas e fiscais.

Dívida interna: gestão de responsabilidades pode gerar default

Na nota divulgada, a S&P justifica a descida do rating com a intenção do Governo moçambicano de realizar um exercício de gestão de responsabilidades sobre as suas obrigações em moeda local. A agência salienta que, em regra, tais operações na categoria CCC são consideradas como transacções em dificuldades (distressed debt exchanges), equivalendo a um incumprimento financeiro.

Além da reclassificação da dívida interna, a S&P alertou para o impacto das tensões pós-eleitorais, que estão a comprometer a execução orçamental e a disponibilidade de liquidez do Estado, agravando o quadro financeiro do país.

Dívida externa mantém rating, mas com risco de nova reclassificação

Apesar da deterioração da posição financeira do país, a S&P manteve o rating das emissões de dívida externa (Eurobonds), mas alterou a sua perspectiva para negativa, sinalizando que uma nova descida poderá ocorrer nos próximos 12 a 18 meses.

A agência sublinha que o défice orçamental moçambicano deverá agravar-se para 4,5% entre 2025 e 2028, superando a previsão anterior de 4,2%, em resultado de quebras na receita fiscal, aumento da despesa com segurança e crescimento económico mais fraco, associado aos protestos pós-eleitorais.

Troca de dívida e o risco de incumprimento

Um dos pontos críticos mencionados no relatório da S&P é o plano do Governo para uma troca de dívida com maturidades em Março, Maio e Setembro de 2025. Caso os termos finais da operação configurem uma troca de dívida em dificuldades, tal poderá motivar a classificação de default pela S&P.

O Executivo deverá reunir-se em breve com bancos privados para negociar extensões de prazos e revisão das taxas de juro, mas a incerteza em torno da negociação aumenta o risco de uma deterioração adicional da notação financeira do país.

Dívida externa: pagamentos mantidos, mas com pressão crescente

Moçambique tem, até ao momento, servido a dívida externa sem atrasos, com um custo anual de 81 milhões de dólares até 2028. No entanto, a partir de 2028 até 2031, os encargos anuais aumentarão para 225 milhões de dólares, pressionando ainda mais as contas públicas antes do arranque da produção de gás na Bacia do Rovuma, previsto para 2030.

A S&P alerta para a possibilidade de novos atrasos no megaprojecto de gás natural da Área 1, avaliado em 20 mil milhões de dólares, o que poderia afectar as previsões de receitas e comprometer ainda mais a sustentabilidade da dívida externa.

Financiamento externo sob risco

Outro factor de preocupação identificado pela agência é a sustentabilidade do financiamento externo, essencial para o equilíbrio das contas públicas. A S&P refere que o actual programa de três anos do Fundo Monetário Internacional (FMI), no valor de 456 milhões de dólares, poderá enfrentar dificuldades caso Moçambique não cumpra as metas fiscais acordadas. Tal colocaria em risco os dois últimos desembolsos do programa, que totalizam 126 milhões de dólares.

Além disso, a suspensão do financiamento da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), que canalizou 664 milhões de dólares para Moçambique em 2023, torna ainda mais difícil o acesso a financiamento externo.

Impactos da revisão do rating

A descida do rating terá repercussões directas e significativas na economia moçambicana. Um rating mais baixo significa custos de financiamento mais elevados, dificultando o acesso a crédito externo e aumentando os encargos da dívida. A deterioração da notação financeira poderá afastar investidores estrangeiros, reduzindo o fluxo de capital para sectores estratégicos da economia. O risco de deterioração económica e a necessidade de cumprir obrigações externas podem levar a uma maior pressão sobre as reservas cambiais, afectando a estabilidade da moeda. Se o Governo não conseguir cumprir as metas orçamentais estabelecidas, poderá perder acesso ao financiamento do FMI, agravando as dificuldades fiscais.

A descida do rating da dívida interna de Moçambique para CCC-, associada a um outlook negativo tanto para as emissões internas como externas, reflecte um momento crítico para a economia moçambicana. A necessidade de uma gestão fiscal rigorosa, aliada à retoma da confiança dos investidores e credores, será essencial para evitar um novo downgrade e garantir a estabilidade económica no médio prazo. O Governo moçambicano enfrenta agora o desafio de negociar uma solução para a sua dívida sem comprometer ainda mais a sua credibilidade financeira, num contexto de pressão fiscal, dificuldades de financiamento externo e incertezas económicas.

Fonte: O Económico

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