SUSTENTA O PROJETO QUE NÃO SUSTENTOU

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Por: Gentil Abel Gentil Carneiro

 

Mudança e o Desaparecimento do SUSTENTA um marco na estratégia agrícola Moçambicana

Em 2017, o antigo ministro da Agricultura, Celso Correia, apresentou o programa SUSTENTA como a nova bandeira para impulsionar o sector agrário em Moçambique. Estruturado em torno da modernização da agricultura familiar, o projecto apostava em três eixos principais: integração dos pequenos produtores em cadeias de valor competitivas, fortalecimento da segurança alimentar e incremento da produtividade através da inclusão social e da tecnologia.

Desde o seu lançamento, o SUSTENTA prometia romper com o modelo de subsistência tradicional, convertendo quintais e machambas de pequenos agricultores em elos activos de uma economia rural mais dinâmica. Para isso, previa a formação técnica dos agricultores, a criação de clusters regionais e parcerias público-privadas destinadas à aquisição de equipamentos e sementes melhoradas.

No discurso inaugural, o então ministro destacou que “a agricultura familiar tem potencial para se tornar o motor de um crescimento económico sustentável, desde que organizada e apoiada por políticas robustas”. Além do investimento em capacitação, o programa contemplava linhas de crédito acessíveis e assistência técnica para aproximar o produtor das práticas agro-industriais.

Muitos moçambicanos viram no SUSTENTA a promessa de revitalizar a vida no campo.

Entretanto, analistas apontavam desafios na execução: atrasos na entrega de insumos, insuficiência de infra-estruturas de armazenagem e uma coordenação ainda incipiente entre ministérios e administrações distritais. Apesar disso, entidades do sector celebram a «visão» de longo prazo inaugurada pelo SUSTENTA, que reconheceu pela primeira vez o agricultor familiar como peça-chave para a soberania alimentar e o desenvolvimento rural.

À medida que o país avançava para a consolidar políticas agrícolas mais inclusivas, o SUSTENTA permaneceu como referencial de uma abordagem que, apesar de inacabada, redefiniu o papel do Estado na promoção de uma agricultura competitiva e socialmente equitativa.

Nos primeiros anos, o SUSTENTA mostrou resultados promissores, agricultores familiares receberam kits de produção, foram contratados 2 158 novos extensionistas, elevando a cobertura de assistência técnica de 4,6 % para 11 %. Para reforçar o trabalho de campo, cada extensionista recebeu um kit de trabalho, uma motorizada e um tablet – num total de 4 224 kits, 2 218 motorizadas e 4 224 dispositivos digitais.

Em várias regiões, a produtividade cresceu. Manchetes de rádio e televisão elogiavam o impacto do programa, afirmando que “o SUSTENTA está a revolucionar a agricultura em Moçambique”.

Uma avaliação de meio termo indicou que quase 190.000 famílias camponesas foram beneficiadas com pacotes de suporte que incluíam sementes melhoradas, fertilizantes e pesticidas. O objectivo era simples, mas ambicioso: fazer com que o agricultor deixasse de produzir apenas para subsistir e passasse também a agricultura comercial de modo a gerar renda familiar.

Contudo, a partir de 2019 começaram a surgir sinais de insatisfação. Técnicos do projecto denunciaram atrasos no pagamento de salários por vários meses; produtores alegaram que os insumos eram insuficientes ou chegavam fora do período ideal; e circularam denúncias de favorecimento a beneficiários com ligações políticas. Acusações de corrupção e má gestão de fundos também ganharam força em relatórios e depoimentos de quem acompanha a execução do programa.

O mais surpreendente foi o actual ministro da Agricultura, Ambiente e Pescas, que qualificou o projecto SUSTENTA como uma iniciativa do executivo anterior, a ser “avaliada no seu contexto original”. O mesmo declarou que está a trabalhar na concepção de um novo programa estratégico para o desenvolvimento agrícola, alinhado com as prioridades do actual mandato, fica no ar a noção de que a prioridade não é o camponês, mas sim o “mandato”.

Segundo o ministro, o foco imediato recai sobre “soluções adaptadas aos desafios actuais do sector”, com ênfase na transparência, na inclusão social e na boa governação.

Não ficou clara a afirmação do actual ministro se o objectivo do desenho do novo programa é cortar com o passado ou corrigir erros do passado com base na experiência anterior, isto é, aprender com as falhas é essencial para construir um sector competitivo e justo.

Segundo o ministro novo programa deverá reforçar a ligação entre pequenos produtores, cadeias de valor e mercados regionais, e garantir que o progresso rural se traduza em benefício para toda a economia. Contudo segundo analistas a decisão de encerrar o programa SUSTENTA pode significar um retrocesso se não for acompanhado de um plano de transição técnico e de prioridades claras. Sem essas garantias, a mudança corre o risco de ser encarada apenas como gesto político, sem reflexos práticos no terreno.

Por outro lado, vozes ligadas à agricultura familiar vêem na descontinuidade como uma janela para corrigir erros históricos: falta de transparência, distribuição desigual de insumos e insuficiente inclusão dos pequenos produtores. “Se esta pausa servir para redesenhar políticas mais alinhadas aos desafios actuais, podemos iniciar uma fase mais eficaz, mais transparente e verdadeiramente centrada no campo moçambicano”, afirma um especialista independente.

O acompanhamento das comunidades rurais, a manutenção de equipes técnicas capacitadas e o estabelecimento de metas objectivas serão cruciais para evitar lacunas na assistência, no financiamento e na gestão de recursos. A forma como o novo programa será concebido e implementado definirá o rumo da agricultura nacional nos próximos anos, ou será mais um elefante branco, como muitos em 50 anos de um mesmo governo com políticas antagónicas.

A questão de fundo é, quais a garantias de sucesso do novo programa?

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