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Friday, November 7, 2025
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Moçambique vive “cascata de emergências”, alerta ONU

Moçambique está mergulhado numa sucessão de crises que se intensifica mês após mês. Um novo relatório do Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) faz soar o alarme: o país enfrenta uma “cascata implacável de emergências”, impulsionada por desastres naturais, surtos de doenças, escassez alimentar e o agravamento do conflito armado no Norte. Segundo o OCHA, Moçambique encontra-se num momento crítico, com várias crises a acontecerem ao mesmo tempo. Os impactos das respostas lentas ou insuficientes não se medem apenas em custos financeiros, mas sobretudo em vidas humanas perdidas e na dignidade das pessoas afectadas.

No norte do país, especialmente na província de Cabo Delgado, o conflito armado activo desde 2017 voltou a escalar. Em Maio deste ano, foi registado o maior número de ataques contra civis desde 2022, com os grupos armados a alargarem as zonas de actuação e a deslocarem-se para perto das estradas principais, dificultando a circulação e comprometendo a entrega de ajuda humanitária. Esta insegurança contínua levou à deslocação de mais de 95 mil pessoas apenas em 2025, muitas das quais vivem agora em condições extremamente precárias, sem acesso regular a alimentos, água, saúde ou protecção básica. Mesmo os mais de 700 mil moçambicanos que regressaram às suas comunidades continuam em situação vulnerável, dependendo da assistência para sobreviver.

A esta instabilidade junta-se o impacto devastador das alterações climáticas. A seca prolongada causada pelo fenómeno El Niño agravou drasticamente a crise alimentar. Actualmente, quase 5 milhões de pessoas enfrentam insegurança alimentar grave, sendo que mais de 900 mil estão em emergência. A escassez de alimentos empurrou milhares de famílias para medidas de sobrevivência extremas, como o casamento precoce de menores ou o sexo em troca de comida. Além disso, cerca de 140 mil crianças já sofrem de subnutrição aguda, o que representa uma ameaça directa à vida e ao desenvolvimento infantil.

Entre Dezembro e Março, três ciclones tropicais atravessaram o território moçambicano, danificando ainda mais as já frágeis infra-estruturas do país. Em várias regiões, os estragos foram severos, com edifícios destruídos, árvores arrancadas e comunidades inteiras isoladas. Com a destruição de sistemas de água e saneamento, agravou-se o surto de cólera, que voltou a surgir com força em Julho deste ano. A propagação da doença é facilitada pela falta de acesso à água potável, pelos deslocamentos massivos e pela escassez de cuidados de saúde.

As mulheres e raparigas têm sido particularmente afectadas por este cenário de emergência contínua. O aumento do número de deslocados e a desorganização dos serviços básicos têm intensificado os riscos de violência baseada no género. Muitos serviços essenciais, como os de apoio psicológico, saúde sexual e reprodutiva, e prevenção da violência de género, foram interrompidos, estima-se que até 75% destes serviços estejam actualmente inactivos, deixando as mais vulneráveis sem protecção.

Apesar de todas estas necessidades urgentes, o financiamento internacional continua muito além do necessário. O Plano de Resposta Humanitária para Moçambique em 2025 solicita 352 milhões de dólares, mas até Julho recebeu apenas 66 milhões, cerca de 19% do valor total. Este défice grave de financiamento compromete não só a resposta imediata, mas também a capacidade de prevenir que a situação se deteriore ainda mais nos próximos meses.

Moçambique é hoje um dos países mais afectados pelas alterações climáticas no mundo. Combinando desastres naturais cíclicos, conflitos armados e uma crise sanitária e alimentar em crescimento, o país enfrenta um cenário de emergência quase permanente. Ainda assim, essa realidade não precisa ser permanente. É fundamental que governos, doadores internacionais, organizações não-governamentais, sector privado e a sociedade civil se mobilizem com urgência para evitar que milhares de vidas continuem a ser perdidas ou destruídas por falta de resposta.

 

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