Destaques
A Dívida interna sobe quase 30% e atinge 39% do total, num contexto de transição estrutural do financiamento e redução da dívida externa influenciada por acordos de reestruturação.
Assim, o stock da dívida pública moçambicana ascendeu a 1.043.544,35 milhões de meticais em 2024, revelando um crescimento de 7,9% face ao ano anterior. Segundo o Relatório Anual da Dívida Pública – 2024, esta evolução resulta da forte expansão da dívida interna, que aumentou 29,7%, passando a representar 39% da carteira total, enquanto a dívida externa sofreu uma contracção de 2,6%.
Transição estrutural no financiamento do Estado
De acordo com o relatório publicado pelo Ministério das Finanças, “este crescimento foi impulsionado pela dívida interna, através das emissões de Bilhetes do Tesouro e do financiamento através do Banco Central”, tendo a componente interna passado de 32% para 39% da estrutura da dívida total (p. 3).
Já a dívida externa reduziu-se 2,6%, o que o documento atribui a “um alívio da dívida ao Iraque, bem como aos ajustamentos de dados resultantes da migração do antigo sistema de gestão da dívida (CS-DRMS) para o novo sistema MERIDIAN” (p. 3 e 11).
Composição por credor e instrumento
No final de 2024, a dívida externa era ainda maioritária (61%), com predominância dos credores multilaterais, que representavam 52% do stock, seguidos dos bilaterais (38%) e do título soberano MOZAM 2032 (10%) (p. 14). Internamente, as Obrigações e Bilhetes do Tesouro reforçaram o seu peso: “verificou-se um aumento de 4pp nas Obrigações do Tesouro e de 1pp nos Bilhetes do Tesouro” em relação a 2023 (p. 11).
Custo da dívida e risco crescente de refinanciamento
A análise da carteira revela um custo elevado associado à dívida interna. O relatório detalha que “a taxa de juro média ponderada […] é de 13,6% na dívida interna, contra 2,2% na externa”, uma diferença substancial que agrava a pressão sobre o serviço da dívida (p. 12). Em termos agregados, “os pagamentos de juros corresponderam a 3,9% do PIB em 2024” .
Do ponto de vista da maturidade, 22% da dívida total vence no espaço de um ano, sendo “47,7% da dívida interna vencível em 12 meses, face a apenas 5,6% da externa”, o que evidencia “um risco elevado de refinanciamento” .
Exposição cambial e riscos sistémicos
A dívida pública continua fortemente exposta a riscos cambiais. O relatório afirma que “61,0% do total da carteira da dívida é constituída por instrumentos indexados à taxa de câmbio” (p. 12), o que fragiliza a sustentabilidade da dívida em contextos de volatilidade cambial, mesmo num ano de relativa estabilidade do metical.
Além disso, o valor presente da dívida externa atingiu 33,1% do PIB, “acima do limite prudencial de 30% para países de baixo rendimento”, o que coloca Moçambique numa zona de alerta, conforme critérios do FMI e da IDA .
Dívidas ocultas: reestruturação com efeito positivo
Um dos acontecimentos mais significativos de 2024 foi o acordo extrajudicial alcançado com o Credit Suisse e o grupo Privinvest, relacionado com as chamadas Dívidas Não Declaradas. Segundo o relatório, “o Estado moçambicano reduziu a exposição de 1,4 mil milhões para 220 milhões de dólares, o que representa uma diminuição de 84% do total reivindicado”. Além disso, “Moçambique deverá receber uma indemnização superior a 825 milhões de dólares”.
Necessidade de prudência e diversificação
A expansão acelerada da dívida interna — com taxas de juro elevadas e vencimentos de curto prazo — representa um desafio crítico para a sustentabilidade fiscal e a gestão da liquidez do Estado. Embora o reequilíbrio com parceiros externos e os ganhos jurídicos na frente das dívidas ocultas tenham trazido algum alívio, o país permanece vulnerável à pressão do serviço da dívida, às variações cambiais e à limitação de fontes de financiamento.
A tendência reforça a urgência de consolidar a política fiscal, alargar a base de receitas e reforçar o acesso a instrumentos de financiamento concessionais e estruturantes.
Fonte: O Económico