Por: Alda Almeida
Nos últimos anos, temos assistido um crescimento alarmante de casos de feminicídio. O assassinato de mulheres pelo simples facto de serem mulheres, frequentemente perpetrado por companheiros ou ex-companheiros. Este fenómeno, que há muito deixa um rasto de dor e indignação, tem vindo a ocupar cada vez mais espaço não apenas nas páginas policiais, mas também nas conversas do quotidiano, reflectindo uma realidade profundamente enraizada na cultura do silêncio e na impunidade.
O feminicídio representa a face mais extrema da violência baseada no género. É o desfecho trágico de um ciclo de abusos físicos, psicológicos, sexuais e económicos, muitas vezes ignorados pelas comunidades e desvalorizados pelas instituições. Em Moçambique, os relatos de mulheres assassinadas por maridos ou namorados tornaram-se demasiado frequentes. Este aumento não é apenas estatístico, é social, cultural e institucional.
Perante este cenário, coloca-se uma pergunta que ecoa como um grito silenciado: para onde vai esta mulher, se o perigo vem da mesma mão que um dia lhe prometeu amor? Para onde foge, se o agressor partilha o mesmo tecto e carrega o mesmo nome que ela um dia tomou como seu? Como pode gritar, se a sua voz é abafada entre paredes que deviam proteger, e não ferir?
Trata-se de uma mulher encurralada entre o medo e a esperança, entre o instinto de sobreviver e a culpa imposta. Entre as leis que falham e os braços que magoam. O seu refúgio transforma-se numa prisão. O lar, num campo de batalha. E o corpo, muitas vezes, torna-se a única prova de um crime que ninguém vê.
Segundo organizações da sociedade civil e órgãos de comunicação social, o número de casos reportados tem vindo a aumentar. No entanto, é sabido que muitos outros permanecem ocultos, silenciados pelo medo, pela vergonha ou pela normalização da violência. É precisamente esse silêncio que perpetua o problema.
Contudo, importa sublinhar que, na maioria dos casos, os sinais estão presentes desde o início, o controlo disfarçado de “zelo”, o ciúme excessivo, a imposição de silêncio, a agressividade verbal, a manipulação emocional. Sinais que são frequentemente negligenciados ou romantizados, até que seja tarde demais.
É crucial que as mulheres estejam atentas a estes comportamentos e não esperem pelo primeiro empurrão, pela primeira bofetada ou pela ameaça directa para reagir. O ciclo da violência raramente começa com o golpe físico, começa no psicológico, no controlo emocional, no medo que se instala de forma subtil. Reconhecer e agir logo nos primeiros indícios pode fazer a diferença entre escapar e sucumbir.
Por isso, é urgente que cada mulher saiba que tem o direito de dizer “não”, de pedir ajuda, de denunciar, de sair. Que compreenda que o amor não deve magoar, que o respeito não se implora e que o medo nunca pode ser a base de uma relação. Ainda que as instituições falhem, ainda que a protecção seja precária, o primeiro passo é quebrar o silêncio. E esse passo começa dentro de casa, dentro de si, no instante em que algo deixa de parecer certo. Denunciar cedo pode salvar uma vida, a sua.