O Governo vai avançar com a remoção gradual da protecção concedida à indústria do cimento, que consistia numa sobretaxa de 20% sobre as importações. A medida visa promover a concorrência, estimular a qualidade e forçar a baixa dos preços no mercado nacional, após anos de apoio ao investimento e consolidação industrial.
A informação foi confirmada pelo Director Nacional da Indústria, Sidónio dos Santos, que explicou que a sobretaxa teve como objectivo garantir a atracção de capital num sector até então débil. A política começou em 1997 com uma sobretaxa de 12,5%, reduzida para 10,5% em 2002, suspensa em 2008 por dois anos para estabilização de preços, e reintroduzida em 2019 com a actual taxa de 20%.
O sector teve um crescimento acelerado, passando de quatro unidades fabris no início da década passada para 16 em 2021, com uma capacidade instalada de 8 milhões de toneladas. Contudo, cinco unidades encerraram em 2022, estando actualmente em funcionamento 11 fábricas com capacidade instalada estimada em 7 milhões de toneladas.
“Era preciso que os investimentos ocorressem num ambiente de protecção. Agora acreditamos que, ao retirarmos essa protecção, será possível compreender melhor a dinâmica dos custos reais, com a entrada de novos players no mercado”, afirmou Sidónio dos Santos.
Modernização e novos investimentos por região
Estão actualmente em curso projectos de expansão e modernização em diversas regiões:
As três unidades referidas têm origem no tempo colonial e pertenciam ao grupo português Cimpor, depois ao brasileiro InterCement e, desde 2020, têm novos accionistas chineses, que estão agora a reabilitar as unidades da Beira e Nacala.
Estrutura do mercado e investigação da concorrência
O Executivo reconhece que a protecção beneficiou sobretudo a Dugongo — a única produtora de matéria-prima para cimento no país — o que gerou concentração de mercado e eliminou a concorrência. A ausência de importações, antes provenientes da China e Paquistão, acentuou este cenário.
“Sabíamos que quando protegêssemos haveria cartéis ou monopólios. Agora, com a remoção da protecção, vamos perceber melhor a dinâmica dos custos”, referiu o responsável.
O Governo aguarda os resultados de uma investigação em curso pela Autoridade Reguladora da Concorrência (ARC), que está a apurar a alegada venda de cimento da Dugongo a preços inferiores no mercado sul-africano — uma prática que poderá configurar dumping, situação que no passado já causou o encerramento de concorrentes no mercado moçambicano.
Pressões políticas e distorção dos preços
A instabilidade no sector foi agravada por um decreto simbólico do ex-candidato presidencial Venâncio Mondlane, que, no quadro do seu alegado “governo paralelo”, estabeleceu um preço máximo de 350 meticais para o cimento. A decisão, sem respaldo legal, gerou confusão no mercado e forçou revendedores e fabricantes a operar com prejuízos.
Face a este cenário, o Governo comprometeu-se a reavaliar a estrutura de custos e margens da cadeia de valor, procurando um modelo mais equilibrado e transparente para o sector.
Caminho para a reforma
Sidónio dos Santos lembra que a aplicação de sobretaxas não pode ser eterna e deve obedecer a regras impostas pela Organização Mundial do Comércio (OMC), devendo ser devidamente fundamentadas tanto na sua introdução como na sua eventual manutenção ou retirada.
“É necessário avaliar o impacto da protecção sobre os investimentos realizados e os seus resultados. Só assim o Governo tomará uma decisão informada sobre a melhor opção para o futuro do sector.”
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p style=”margin-top: 0in;text-align: justify;background-image: initial;background-position: initial;background-size: initial;background-repeat: initial;background-attachment: initial”>Com investimentos em curso, novas capacidades a emergir e um mercado em busca de estabilidade, a transição para um modelo liberalizado exigirá regulação sólida, transparência e mecanismos eficazes de fiscalização. O cimento, produto vital para a construção e o desenvolvimento de infra-estruturas, não pode continuar a ser vítima de distorções económicas nem de jogos de força político-empresariais.
Fonte: O Económico