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Hospitais públicos em Moçambique: esperança ou desespero?

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Por: Gelva Aníbal

Sistema Nacional de Saúde: Entre a Promessa e o Abandono

Durante décadas, o discurso oficial sobre a melhoria do sistema nacional de saúde tem sido marcado por promessas recorrentes e planos ambiciosos. No entanto, a realidade que se impõe nos hospitais públicos do país é um retracto cruel da negligência institucional. Camas enferrujadas, pacientes estendidos no chão, escassez de medicamentos essenciais, profissionais exaustos e improvisações diárias revelam um cenário onde o sofrimento deixou de ser excepção e passou a ser rotina.

Para muitos cidadãos, o hospital público representa a última esperança de sobrevivência; para outros, é o início de um calvário. A precariedade é visível, mas não pode ser atribuída exclusivamente à crise económica. A má gestão, a corrupção e a ausência de fiscalização são elementos centrais que agravam a situação. Recursos são alocados, mas não chegam ao destino final. Medicamentos desaparecem das farmácias hospitalares e reaparecem em clínicas privadas. Equipamentos doados somem sem explicação, enquanto vidas se perdem nas filas de espera.

Num país que investe milhões em actos “solenes” ou eventos de grande porte, persistem maternidades sem água corrente e casas de banho insalubres em unidades de saúde. A disparidade entre o investimento em infra-estrutura de fachada e a negligência com os serviços essenciais revela prioridades distorcidas e uma gestão pública desconectada das necessidades reais da população.

A normalização da dor é talvez o sintoma mais grave. Gritos nos corredores já não causam espanto. A perda de um filho por falta de uma seringa é tratada como uma fatalidade inevitável. A indignação tornou-se rara, e os que ousam denunciar são ignorados ou silenciados. O silêncio da sociedade e a ausência de responsabilização por parte do Estado e dos gestores hospitalares perpetuam um sistema que falha justamente os que mais dele dependem.

Apesar do abandono, há quem resista. Médicos, enfermeiros, técnicos e auxiliares enfrentam condições desumanas, salários em atraso, ameaças e falta de apoio institucional. Ainda assim, mantêm viva a vocação de servir. São os verdadeiros pilares de um sistema que, sem eles, já teria colapsado por completo.

Ignorar os limites dessa dedicação é perigoso. Os hospitais públicos deveriam ser o coração pulsante do sistema de saúde, espaços de dignidade, não de desespero. Mas essa transformação só será possível quando a sociedade deixar de aceitar o mínimo como favor e passar a exigir o máximo como direito.

A pergunta que se impõe é clara: até quando continuaremos a permitir que o sistema de saúde mate aqueles que mais dele precisam?

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