As obras de pavimentação da Avenida Dom Alexandre, em Marracuene, continuam paralisadas, há mais de um ano, uma situação que eleva a preocupação dos utentes da via. O INGD, principal responsável pela implementação do projecto financiado pelo Banco Africano de Desenvolvimento, recusou-se a prestar esclarecimentos sobre a situação, durante uma semana de contactos com a nossa equipa de reportagem. O edil de Marracuene diz que está desapontado e apela por respostas rápidas.
Há um ano e quatro meses que a Avenida Dom Alexandre, no distrito de Marracuene, vive de promessas que nunca saíram do papel. O troço de cerca de 10 quilómetros, que deveria ligar Mahotas à vila autárquica, continua em estado de degradação, com buracos, poças e desvios improvisados que tornam a vida dos munícipes cada vez mais difícil, sobretudo no tempo de chuva.
O projecto de pavimentação da via, avaliado em cerca de seis milhões de dólares, integra um fundo mais amplo de apoio do Banco Africano de Desenvolvimento, estimado em quarenta e sete milhões de dólares, destinado a iniciativas de resiliência climática e melhoria de infraestruturas. No entanto, a execução da obra permanece paralisada devido a sucessivos falhanços processuais e à falta de entendimento entre o financiador e o Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastres, que deveria ser o responsável direto pela implementação.
Os problemas começaram logo no concurso para a contratação do fiscal independente, condição imposta pelo BAD para o desembolso dos fundos. O concurso foi cancelado porque a proposta vencedora ultrapassa em muito o valor de referência definido pelo banco. Enquanto a empresa concorrente apresentou uma proposta de cerca de 864 mil dólares, o BAD estabelecia como aceitável um teto próximo de 294 mil dólares. O desfasamento levou ao cancelamento do processo e ao consequente bloqueio do projecto. Desde então, relatórios técnicos e propostas de ajustamento foram trocados entre o INGD e o BAD, mas sem consenso. O estaleiro do empreiteiro chegou a ser montado no local, mas foi posteriormente abandonado, com todas as máquinas removidas, deixando atrás de si apenas mais frustração para a população.
O silêncio do INGD agrava a situação. Durante uma semana inteira, o jornal O País tentou, sem sucesso, obter esclarecimentos junto da instituição, que se recusou a falar sobre o assunto, alegando apenas tratar-se de um processo em curso. Em várias outras ocasiões, o INGD limitou-se a justificar os atrasos com a complexidade da contratação do fiscal, mas nunca apresentou um ponto de situação claro à sociedade, alimentando a percepção de falta de transparência e de descoordenação institucional.
Essa postura tem sido criticada por moradores e pelo próprio edil de Marracuene, Shafee Sidat, que diz sentir-se envergonhado pela paralisação das obras. O autarca garante ter solicitado explicações ao BAD e ao INGD, mas sem sucesso, admitindo que poderá escalar o assunto ao primeiro-ministro e ao Presidente da República caso o impasse se mantenha.
“Está uma vergonha. Continuo a dizer que para mim aquele processo é um processo que me deixa muito triste e transtornado. Disseram que faltava fiscal, eu pessoalmente falei com o ministro na altura e ofereceu-se um fiscal. Depois disseram que queriam concurso, fizeram concurso e já há fiscal. Agora o que é que lhes falta mesmo?”, questionou Sidat, claramente revoltado.
Enquanto as instituições trocam responsabilidades, é a população que paga a conta. Os moradores relatam que, em dias de chuva, a estrada se transforma num martírio, impossibilitando o transporte público de circular e obrigando famílias a fazer longas caminhadas. Chapas deixam de passar, carros particulares atolam-se e pequenos negócios perdem clientela.
“Eles sempre prometem que vão executar as obras, mas até agora estamos à espera, não há nada. Aqui quando chove é um martírio. Temos que desenhar caminhos para sair de casa. Tanto no transporte pessoal quanto no público, os chapas não circulam”, desabafou um residente. Outro acrescenta: “É complicado aparecerem, fazerem promessas e não concretizaram. Esta estrada é um polo de desenvolvimento. Há muito investimento aqui, mas sem acesso não há nada. O que exigimos é transparência”.
Os problemas viários de Marracuene, no entanto, não se limitam à Avenida Dom Alexandre. Outras estradas estratégicas estão igualmente degradadas e sem solução à vista. A ligação entre a FAO e Ricatla, fundamental para a circulação de pessoas e mercadorias, está em pedaços e o município prometeu lançar em breve o concurso público para selecionar o empreiteiro responsável pela sua reabilitação.O edil garantiu que o processo estaria concluído em duas a três semanas, mas até ao momento nada de concreto foi avançado.
Já em Mali–Santa Isabel, outra zona de difícil acesso, os moradores queixam-se de dias penosos e de uma estrada praticamente intransitável. Sidat afirmou que já foi encontrado o empreiteiro para a execução das obras e que o processo foi submetido ao Tribunal Administrativo e à Procuradoria Provincial, mas, mais uma vez, a promessa ainda não saiu do papel.
A realidade mostra que a fraca coordenação entre financiadores internacionais e instituições nacionais está a penalizar diretamente os cidadãos, que continuam sem respostas claras. Os fundos existem, os projectos estão no papel, mas os entraves burocráticos, as divergências sobre concursos e a ausência de comunicação transparente tornam as promessas num exercício de frustração coletiva. A população de Marracuene exige prazos concretos e responsabilização das instituições envolvidas, sob pena de a Avenida Dom Alexandre e outras vias do distrito permanecerem como símbolos do fracasso administrativo e da falta de compromisso com o desenvolvimento local.
Fonte: O País