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Num movimento inesperado e executado em apenas 10 minutos de videoconferência, a OPEP+ decidiu acelerar a reposição da sua produção petrolífera, agravando a trajectória de excesso de oferta no mercado mundial. A decisão, que favorece os consumidores e alinha-se com os objectivos políticos do Presidente dos EUA, Donald Trump, poderá, no entanto, ter repercussões profundas tanto para produtores dentro como fora da
A decisão da OPEP+ de restaurar 548 mil barris por dia já em Agosto — valor superior aos aumentos de Maio, Junho e Julho — marca uma viragem estratégica, com implicações para a oferta global de petróleo no segundo semestre de 2025. O movimento, aparentemente impulsionado pela procura sazonal de Verão e pela vontade de reconquistar quota de mercado, contrasta com os alertas de diversas instituições, incluindo a Agência Internacional de Energia (AIE), que já previam um excedente de 1,5% do consumo global no último trimestre do ano.
Para os consumidores, a decisão representa um alívio potencial sobre os preços dos combustíveis. Para os produtores, porém, o cenário é distinto: a pressão descendente sobre os preços compromete investimentos e margens, num contexto já marcado por volatilidade geopolítica e incerteza económica global.
Ganhos Políticos para Washington, Pressões para os Produtores
O anúncio surge como uma vitória política para o Presidente Trump, que tem insistido publicamente na necessidade de baixar os custos dos combustíveis, como resposta à crise do custo de vida e como manobra de contenção inflacionária. A medida poderá também apoiar a sua agenda de redução de taxas de juro e imposição de tarifas comerciais.
Contudo, o alívio nos preços poderá sair caro à própria indústria petrolífera norte-americana. Empresas de exploração de xisto — que apoiaram a campanha de Trump — admitem reduzir o número de poços em 2025, dada a deterioração da rentabilidade projectada.
“O ciclo de expansão e contração nos EUA pode ser acelerado com esta decisão da OPEP+. O custo de exploração nos campos de xisto não tolera preços abaixo dos 70 dólares por barril por muito tempo”, comentou uma fonte da indústria.
Sauditas Apostam no Volume, Mas Enfrentam Pressões Orçamentais
A Arábia Saudita parece apostar no curto prazo, aumentando os prémios cobrados pelo seu crude emblemático na Ásia — sinal de confiança na absorção da oferta adicional. Ainda assim, o país enfrenta desequilíbrios orçamentais significativos, agravados pela queda recente dos preços do petróleo (com futuros em Londres a recuar 11% em duas semanas).
Segundo o FMI, Riad necessita de um preço superior a 90 dólares por barril para equilibrar as contas públicas e financiar os ambiciosos projectos do Príncipe Herdeiro Mohammed bin Salman. Cortes orçamentais já foram registados, e persistem dúvidas sobre quanto tempo poderá sustentar esta ofensiva de mercado sem comprometer a sua agenda de reformas.
“Há sempre a opção de um volte-face”, reconhece Neil Atkinson, antigo director de mercados da AIE. “Mas para já, os sauditas parecem determinados a reconquistar mercado — mesmo que isso signifique aceitar preços mais baixos.”
Impactos no Mercado Global e no Equilíbrio da OPEP+
Embora o aumento de produção seja formalmente aprovado, o impacto real poderá ser menor, dado que vários países, como o Cazaquistão, continuam a exceder quotas anteriores. O Ministro da Energia saudita, Abdulaziz bin Salman, tem pressionado membros com histórico de incumprimento a abdicarem de aumentos.
Ainda assim, a decisão representa uma inversão da redução de 2,2 milhões de barris por dia decidida em 2023 — um ano antes do calendário inicial — e poderá agravar a fragmentação interna da aliança, com tensões entre os objectivos de estabilidade de preços e ganhos de quota de mercado.
Perspectiva Final
A nova ofensiva da OPEP+ traduz-se num dilema clássico: defender preços ou garantir quota de mercado. Ao privilegiar o segundo, o cartel responde a estímulos políticos externos e oportunidades conjunturais, mas arrisca minar os seus próprios fundamentos económicos.
Numa altura em que a procura chinesa desacelera e os riscos de recessão global persistem, o petróleo poderá voltar a ser o termómetro das fragilidades geoeconómicas — e a OPEP+, longe de ser unânime, terá de lidar com os custos desta escolha estratégica.
Fonte: O Económico