Destaques:
A prorrogação da isenção do IVA sobre produtos básicos essenciais até ao final de 2025 relança o debate sobre o papel da política fiscal no alívio do custo de vida e no estímulo ao sector produtivo. Embora a medida seja bem acolhida, cresce o questionamento sobre a sua suficiência, abrangência e impacto real na competitividade económica e no poder de compra das famílias moçambicanas.
A Assembleia da República aprovou por consenso, e em definitivo, a prorrogação da isenção do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) para três categorias de produtos de primeira necessidade: açúcar, óleos alimentares e sabões, bem como toda a cadeia associada à sua produção, distribuição e importação de matérias-primas. A isenção vigorará até 31 de Dezembro de 2025, com impacto fiscal estimado em 2.270,79 milhões de meticais, segundo dados do Governo.
O alívio fiscal aprovado é visto por muitos como uma resposta táctica ao agravamento do custo de vida, mas também como um teste à capacidade do Estado de usar a política fiscal como instrumento de estímulo económico e protecção social.
“Acreditamos que esta medida vai-se fazer sentir no bolso dos moçambicanos”, afirmou Nelson Guirrugo, deputado da Frelimo, ao sublinhar que o IVA de 16% continua elevado para o contexto socioeconómico do país.
IVA: instrumento de alívio ou entrave estrutural?
A medida reabre um debate recorrente sobre o nível ideal do IVA em Moçambique e a sua eficácia como instrumento de redistribuição e estímulo à produção nacional. Embora pontualmente positiva, a isenção selectiva levanta questões quanto à sustentabilidade orçamental, à eficácia da fiscalização e à transmissão efectiva do benefício ao consumidor final — sobretudo em zonas mais remotas e com custos logísticos elevados.
O deputado Saimone Macuiana, da Renamo, foi explícito ao relacionar o IVA com os preços dos combustíveis e com a dificuldade de transmissão real do benefício ao consumidor:
“Se mantivermos o mesmo preço dos combustíveis, dificilmente essa redução irá se reflectir na produção.”
Produção nacional e sector real: onde está o impacto?
Do ponto de vista do sector real da economia, a isenção do IVA na cadeia produtiva pode representar uma redução efectiva nos custos operacionais das indústrias de bens básicos, melhorando a margem de lucro, a competitividade interna e eventualmente até as exportações regionais desses produtos.
No entanto, o ganho depende do comportamento do mercado, da acção da fiscalização e da capacidade das empresas em repassar esse alívio ao consumidor, num contexto de informalidade persistente e fraca concorrência em vários segmentos.
Propostas para além dos bens alimentares: educação, energia e água
As bancadas da oposição — Renamo, MDM e PODEMOS — aproveitaram o debate para defender uma extensão da isenção a outros sectores estratégicos, como o ensino privado, a energia eléctrica, a água potável e até o pagamento de propinas.
Judite Macuácua (MDM) defendeu a necessidade de baixar o IVA para 14% e ampliar o leque de bens isentos:
“Não é apenas no açúcar, óleo e sabões. A isenção deve incluir também electricidade, água potável e educação.”
Uma questão fiscal com contornos políticos
A decisão parlamentar surge também num contexto político tenso, após as manifestações violentas que marcaram o pós-eleitoral, e onde o “Compromisso para o Diálogo Nacional Inclusivo” começa a moldar consensos políticos. A aprovação unânime do diploma fiscal poderá ser lida, em parte, como um gesto de pacificação.
“É no espírito do diálogo político que o PODEMOS decide aprovar este instrumento”, declarou Ivandro Massingue, deputado do PODEMOS.
Entre o alívio imediato e a reforma estrutural
A prorrogação da isenção do IVA oferece um alívio temporário para consumidores e produtores, mas coloca novamente em cima da mesa o desafio de reformar a política fiscal com visão de médio e longo prazo, promovendo simultaneamente justiça social, dinamização económica e sustentabilidade orçamental.
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p style=”margin-top: 0in;text-align: justify;background-image: initial;background-position: initial;background-size: initial;background-repeat: initial;background-attachment: initial”>Se mal calibrado, o IVA pode penalizar a produção e o consumo. Se bem estruturado, pode ser um instrumento poderoso de descompressão económica e estímulo ao sector real. O debate está em curso — e o momento fiscal de Moçambique exige decisões mais profundas que apenas prorrogações anuais.
Fonte: O Económico