Num contexto de crescentes tensões comerciais globais, a UNCTAD alertou para os efeitos desproporcionais das tarifas recíprocas recentemente propostas pelos Estados Unidos, recomendando a sua exclusão quando aplicadas a países em desenvolvimento estruturalmente vulneráveis. A medida, suspensa por 90 dias, poderá gerar consequências socioeconómicas graves sem ganhos significativos para o Tesouro norte-americano.
Num relatório publicado a 14 de Abril, intitulado “Escalating tariffs: The impact on small and vulnerable economies”, a UNCTAD lança um apelo aos decisores norte-americanos: excluir os países mais frágeis das tarifas recíprocas previstas no novo pacote tarifário dos EUA.
As chamadas tarifas recíprocas, calculadas com o objectivo de equilibrar o défice comercial bilateral com 57 parceiros, impõem taxas que variam entre 11% para os Camarões e 50% para o Lesoto. Entre estes parceiros, 11 são países menos desenvolvidos e 28 representam menos de 0,1% do défice comercial dos EUA, sendo que o seu impacto global é marginal.
Economias pequenas, riscos elevados
Segundo a UNCTAD, muitos destes países são estruturalmente frágeis, com baixa capacidade de compra e limitada relevância enquanto mercados de exportação para os EUA. No entanto, as tarifas recíprocas poderão afectar de forma significativa a sua capacidade de gerar receitas e manter a estabilidade comercial interna.
“O efeito líquido para os EUA seria quase nulo, mas o impacto sobre as receitas públicas destes países poderia ser severo”, alerta o relatório.
Impacto limitado nas receitas norte-americanas
A análise da UNCTAD revela que, mesmo que os níveis de importação de 2024 se mantivessem, a implementação destas tarifas resultaria num aumento inferior a 1% nas receitas alfandegárias actuais dos EUA para 36 dos 57 parceiros afectados. Ou seja, o custo político e económico global da medida superaria largamente os seus benefícios fiscais.
Riscos para os consumidores norte-americanos
O relatório chama ainda a atenção para as consequências internas nos EUA, particularmente para o consumidor. Muitos dos países visados fornecem produtos agrícolas que os EUA não produzem internamente — como a baunilha de Madagáscar, o cacau da Costa do Marfim e do Gana —, para os quais há poucos ou nenhuns substitutos viáveis.
Só em 2024, os EUA importaram:
– cerca de 150 milhões USD em baunilha de Madagáscar;
– 800 milhões USD em cacau da Costa do Marfim;
– 200 milhões USD em cacau do Gana.
Um aumento tarifário nestes produtos não só teria impacto marginal em receitas como provocaria aumentos significativos nos preços finais ao consumidor norte-americano.
Defesa de um comércio mais justo e equilibrado
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p style=”margin-top: 0in;text-align: justify;background-image: initial;background-position: initial;background-size: initial;background-repeat: initial;background-attachment: initial”>A UNCTAD insiste que um sistema comercial multilateral assente em regras equitativas deve salvaguardar as economias mais vulneráveis. O relatório sublinha que, nos últimos anos, o comércio internacional beneficiou de uma tendência de liberalização tarifária, com dois terços do comércio mundial isento de tarifas em 2023. A inversão desta lógica poderá minar a confiança no sistema e agravar a exclusão económica dos países menos desenvolvidos.
Fonte: O Económico