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A Reserva Federal dos Estados Unidos (Fed) decidiu, esta quarta-feira, manter inalterada a taxa de juro de referência, numa decisão dividida que evidenciou o crescente peso da política sobre a independência da autoridade monetária.
Pela quinta vez consecutiva, o Comité Federal de Mercado Aberto (FOMC) manteve a taxa dos fundos federais entre 4,25% e 4,50%, numa votação de 9 contra 2, com dissidências históricas de dois governadores nomeados por Donald Trump: Michelle Bowman e Christopher Waller, que preferiam uma redução imediata de 0,25 pontos percentuais.
Pressão Presidencial e Resistência Institucional
Apesar das pressões públicas e reiteradas do Presidente Trump para um corte nas taxas – com o argumento de aliviar os custos da dívida pública –, o Presidente da Fed, Jerome Powell, reafirmou a posição de independência da instituição e a necessidade de cautela:
“Não tomámos ainda nenhuma decisão sobre Setembro. Há tempo para avaliar os dados”, afirmou Powell, classificando a actual política como “moderadamente restritiva”, tendo em conta a inflação ainda acima da meta e a resiliência do mercado laboral.
Esta foi a primeira vez em mais de 30 anos que dois membros do Conselho de Governadores da Fed votaram contra uma decisão de política monetária, num episódio que poderá reacender o debate sobre a autonomia da Fed perante o poder político.
Panorama Económico: Sinais Mistos
O comunicado oficial da Fed reconhece que o crescimento económico moderou no primeiro semestre do ano, ao mesmo tempo que o desemprego se manteve baixo e a inflação ainda apresenta níveis elevados. A incerteza continua elevada, e a autoridade monetária declarou que só avançará para cortes se houver clareza suficiente sobre a trajectória da inflação e do emprego.
Segundo o Departamento do Comércio, o crescimento do PIB dos EUA superou ligeiramente as expectativas no segundo trimestre, mas esse desempenho foi largamente sustentado pela queda nas importações, enquanto a procura interna registou o crescimento mais lento dos últimos dois anos e meio.
Reacção dos Mercados e Expectativas Futuras
Os rendimentos dos títulos do Tesouro norte-americano subiram no final da sessão, enquanto os principais índices bolsistas encerraram em queda. Os mercados de futuros reduziram a probabilidade de um corte em Setembro, embora ainda mantenham essa possibilidade em aberto, sobretudo se os próximos indicadores macroeconómicos forem menos animadores.
As dissidências no seio da Fed deverão ser acompanhadas de explicações formais por parte dos governadores discordantes, esperadas para sexta-feira, o que poderá lançar ainda mais luz sobre as tensões internas e o equilíbrio entre ortodoxia monetária e pragmatismo político.
A decisão de manter as taxas reflete a prudência de uma Fed cada vez mais pressionada por factores exógenos, incluindo a crescente ingerência política, as incertezas geopolíticas e um panorama económico ambíguo. Com Trump a elevar o tom e dois dos seus nomeados a votarem contra, o risco de politização da política monetária volta a ganhar relevância, num momento em que a estabilidade e a credibilidade do banco central são cruciais para a confiança dos mercados.
Enquanto isso, Jerome Powell continua a equilibrar-se numa corda bamba institucional, determinado em manter a Fed fora das trincheiras eleitorais, mas ciente de que os próximos meses poderão ser ainda mais turbulentos.
Fonte: O Económico