Questões-Chave:
O Instituto Nacional de Minas (INAMI) apresentou publicamente, esta semana, uma proposta de revisão da Lei de Minas que visa canalizar 10% das receitas obtidas pelas operações mineiras para o desenvolvimento das comunidades, distritos e províncias onde essas actividades decorrem. A medida inscreve-se num pacote mais amplo de reformas que inclui a criação de uma Autoridade Reguladora Mineira e de uma Agência de Promoção Mineira, no contexto de reestruturação institucional e de auscultação pública sobre o futuro quadro legal dos sectores de minas, energia e hidrocarbonetos.
Embora acolhida como um sinal positivo de que o Estado reconhece a necessidade de redistribuir os benefícios da extracção mineral, a proposta também suscitou críticas e dúvidas quanto à sua eficácia e ambição.
Uma Medida Emblemática, Mas Ainda Limitada
A proposta do INAMI representa uma inflexão relevante em direcção a uma abordagem mais inclusiva da política mineira. A ideia de partilhar receitas com as comunidades afectadas tem ganho expressão global como mecanismo de justiça distributiva e de construção de legitimidade social em torno dos projectos extractivos.
Contudo, a percentagem proposta – 10% – foi considerada “ínfima” por representantes da sociedade civil, como Fátima Mimbire, da ONG N’weti, que defende percentagens na ordem dos 50% ou mais, com repartição estruturada entre província e distrito.
“Não se trata apenas de transferir recursos, mas de reparar um desequilíbrio estrutural na forma como o país tem beneficiado – ou não – da exploração dos seus recursos naturais”, sublinha Mimbire.
Lições de Outras Realidades: O Que Diz a Experiência?
Países com características semelhantes a Moçambique, tanto em termos de estrutura económica como de dependência dos recursos naturais, oferecem lições importantes sobre a partilha de receitas com comunidades locais.
Estas experiências demonstram que a simples definição de uma percentagem não garante impacto transformador. A eficácia depende de quatro factores centrais: (1) desenho do modelo institucional de gestão dos fundos; (2) mecanismos de participação e fiscalização comunitária; (3) capacidade local de absorção e planeamento; e (4) alinhamento com estratégias de desenvolvimento territorial.
O Potencial Transformador: Oportunidade ou Ilusão?
Em termos de potencial, a proposta do INAMI pode representar um ponto de viragem para o modelo extractivo moçambicano, historicamente marcado pela exportação de matérias-primas em bruto e pouco retorno directo para as comunidades afectadas.
Se bem concebido e implementado, o modelo pode:
Porém, o risco é que a medida se transforme num instrumento de retórica, se não vier acompanhada de reformas na arquitectura institucional, de mecanismos robustos de fiscalização e de acesso público à informação sobre os fluxos financeiros.
Reflexões Finais: A Oportunidade de um Novo Paradigma
O momento de revisão da Lei de Minas oferece a Moçambique uma rara oportunidade para redefinir a sua relação com os seus recursos naturais. Mais do que ajustar percentagens, o desafio reside em construir uma política mineira centrada na redistribuição justa, na sustentabilidade, na industrialização e no enraizamento territorial do desenvolvimento.
A criação da Autoridade Reguladora e da Agência de Promoção poderá ser um passo nessa direcção, desde que venha acompanhada de capacidade técnica, independência, e clareza de mandatos.
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p style=”margin-top: 0in;text-align: justify;background-image: initial;background-position: initial;background-size: initial;background-repeat: initial;background-attachment: initial”>Moçambique tem agora a possibilidade de evitar os erros do passado e de outras geografias, ancorando a sua reforma num modelo que privilegie equidade, transparência, participação e resultados concretos para os cidadãos.
Fonte: O Económico