Tokenização Em África: Uma Nova Arquitectura Financeira Para o Século XXI

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Mais do que uma inovação tecnológica, a tokenização representa para África a possibilidade de reimaginar os seus mercados financeiros a partir de uma lógica descentralizada, inclusiva e orientada para a liquidez. Em vez de depender de modelos tradicionais de intermediação financeira, a tokenização propõe uma arquitectura mais acessível, escalável e democrática — e, nesse processo, pode remodelar o papel do investidor africano no seu próprio desenvolvimento.

A Nova Fronteira da Inclusão Financeira

Durante décadas, os sistemas financeiros africanos foram dominados por um pequeno número de intermediários, altos requisitos de capital e infraestruturas lentas. Mesmo em países com robustez macroeconómica, os mercados de capitais continuam limitados em profundidade e em alcance. O investimento continua reservado a elites, fundos institucionais ou actores estrangeiros.

É neste contexto que a tokenização se apresenta como um mecanismo de transformação. Ao permitir a aquisição de fracções de activos – como imóveis, obrigações, acções ou até infraestruturas – ela introduz um novo paradigma: o da participação financeira em escala granular. Um pequeno agricultor em Nampula, um comerciante em Abidjan ou um estudante em Dakar podem, em tese, adquirir uma parte de um parque solar, de um fundo agrícola ou de um edifício urbano em tokens digitais, a partir do seu telemóvel.

O exemplo de Lagos, Nigéria, com a tokenização do mercado imobiliário, é ilustrativo: milhares de cidadãos poderão aceder ao investimento imobiliário sem necessidade de hipoteca ou grandes poupanças. Do mesmo modo, o sucesso da emissão de obrigações digitais da Die MOS na África do Sul abre caminho para novas formas de financiamento às PME’s com recurso a investidores retalhistas.

Mobilizar a Diáspora, Reduzir o Custo do Capital

As remessas da diáspora africana continuam a ser uma fonte estável, robusta e ainda subutilizada de financiamento. Com 54 mil milhões USD enviados em 2023, estas transferências superam já o Investimento Directo Estrangeiro (IDE) na região. A tokenização permite ir além das tradicionais obrigações da diáspora, criando instrumentos digitais que captam poupanças de forma mais ágil, com liquidação quase imediata e custos operacionais mais baixos.

Ao canalizar directamente remessas para projectos locais — através de stablecoins ou obrigações tokenizadas — os países africanos poderão reduzir os custos de financiamento e os riscos cambiais, ao mesmo tempo que fortalecem a autonomia financeira dos seus cidadãos no exterior.

Regulação: O Elo Faltante

Apesar do potencial, a tokenização enfrenta o seu maior obstáculo na ausência de quadros legais e fiscais claros. Países como o Quénia e a Nigéria começaram a avançar com projectos de lei e políticas públicas que conferem legitimidade e previsibilidade aos activos digitais. A África do Sul, com o seu roteiro para pagamentos digitais, também sinaliza vontade reformista.

Contudo, a fragmentação regulatória e o receio de perda de controlo estatal sobre fluxos de capital continuam a limitar o avanço desta revolução. A construção de uma regulação pan-africana coordenada, ancorada em princípios de transparência, inclusão e interoperabilidade, será essencial para desbloquear o verdadeiro valor da tokenização.

Tokenização Não É Criptoespeculação

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p style=”margin-top: 0in;text-align: justify;background-image: initial;background-position: initial;background-size: initial;background-repeat: initial;background-attachment: initial”>Importa distinguir a tokenização enquanto instrumento de modernização dos mercados de capitais do universo especulativo das criptomoedas. A proposta é estrutural: trazer activos reais — imóveis, dívida, participação em projectos — para uma arquitectura digital segura, transparente e acessível. Como sublinha Frank Mwiti, “tokenização não é uma palavra da moda”, mas sim uma ferramenta estratégica para financiamento do desenvolvimento.

Num continente onde as PME’s enfrentam enormes dificuldades de acesso ao crédito, onde a juventude busca plataformas para poupar e investir, e onde os Estados precisam urgentemente de capital para infra-estruturas, educação e energia, a tokenização oferece uma via alternativa — e potencialmente disruptiva.

A tokenização está a abrir caminho para um novo modelo financeiro em África: mais inclusivo, mais participativo e mais conectado com as realidades digitais do continente. Mas esta promessa não se realiza por inércia. Exige liderança, visão política, capacidade regulatória e articulação regional. A janela de oportunidade está aberta — e cabe às lideranças africanas decidir se querem ser pioneiras ou espectadoras na construção desta nova arquitectura financeira.

Fonte: O Económico

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