Por: Alfredo Júnior
Há um silêncio que só existe nas filas dos hospitais. Não é silêncio de paz, é silêncio de espera, um silêncio feito de olhares baixos, tosses abafadas, mães com bebés no colo e senhores que se encostam às paredes, como quem já perdeu a luta contra o tempo.
Ali, o tempo não corre, rasteja, cada número chamado ao balcão é uma espécie de vitória pequena, uma esperança que se levanta devagar, entre o ranger das cadeiras de plástico.
Na fila do hospital, a dor aprende a esperar, não importa se vieste com febre ou com feridas abertas, todos ali têm algo que os aperta por dentro e não é só o corpo. É também a alma, cansada de promessas, anestesiada pela rotina de um sistema que parece adoecer junto com os seus doentes.
Uma mulher segura o filho que arde em febre, que está ali já á quatro horas. O menino dorme, inquieto, com a cabeça encostada ao ombro dela. À frente, um jovem tenta ligar para casa, "Ainda estou na fila, mã, não sei se vou conseguir ser atendido hoje."
Naquele espaço, as histórias se acumulam como fichas perdidas. Pessoas que chegam de madrugada, outras que vêm de bairros distantes, que caminharam com dor por quilómetros, na esperança de um "doutor" que os olhe, os toque, os cure.
Mas o hospital, esse gigante cansado, não dá conta. Tem falta de tudo, falta médicos, falta medicamentos, falta organização, mas acima de tudo, falta respeito pela dignidade de quem ali chega frágil
Mesmo assim, ninguém desiste, porque no fundo, cada um naquela fila acredita que ainda vale a pena lutar por um lugar na vida, mesmo que esse lugar seja uma cadeira partida, num corredor esquecido, à espera de um número que talvez nem chegue hoje.
Na fila do hospital, a dor é colectiva, mas também é ali que se ouve o melhor do povo moçambicano, o “aguenta, mana”, o “vai passar”, o “dei o teu lugar, irmão”. Nessa partilha silenciosa, há humanidade que nem o sistema conseguiu adoecer.
